5 furos de roteiro de The Batman
Vamos combinar: The Batman é um filme incrível em todos os sentidos. Do roteiro à parte técnica, tudo o que o diretor Matt Reeves fez com o Homem-Morcego é realmente memorável, o que faz com que o longa seja não só um excelente filme de super-herói ou baseado em quadrinhos, mas cinema da melhor qualidade — o que não o isenta de ter alguns errinhos aqui e ali.
São aquelas situações forçadas que destoam do clima bastante verossímil da trama ou coisas que são mal explicadas e soam como furos de roteiro dentro da história. Afinal, com tanta coisa acontecendo em mais de três horas, nem sempre é simples amarrar todas as pontas.
Não é nada que tire o brilho da adaptação, mas que mostram que o Cavaleiro das Trevas é tão humano quanto qualquer um de nós — ou que, pelo menos, conta com uma equipe de produção longe de ser perfeita.
Logo na primeira aparição do Batman no filme, vemos ele socando um grupo de bandidinhos nas ruas de Gotham e entregando uma das melhores frases de efeito de todo o longa. Ao ser questionado sobre quem ele é, o herói distribui socos e quebra braços e termina sua tortura com um sonoro “Eu sou a Vingança”.
Fica claro ali que essa é só uma frase de efeito para criar medo e impor respeito — algo que faz parte da estratégia do personagem para tentar dar medo nos criminosos. É algo legal, mas bastante pontual.
O problema é que, apesar disso, todo mundo passa a chamá-lo de Vingança ao longo do filme. Selina (Zoë Kravitz), o Pinguim (Colin Farrell) e até o seguidor do Charada que é esmurrado na sequência final o chamam assim. Praticamente todo mundo sabe que Robert Pattinson falou isso para um bandido qualquer e passa a usar isso para ironizar o herói.
É claro que você pode argumentar que o personagem fala isso para todo mundo, mas isso implica em uma questão ainda mais complicada. Se o Batman realmente sai por aí se apresentando como Vingança, é porque ele quer ser chamado dessa forma e a imprensa e todo mundo em Gotham decidiu chamá-lo de Batman pelo fato de ele ser um homem-morcego.
É tipo aquele seu amigo que tenta emplacar um apelido maneiro, mas todo mundo chama de outra coisa só para sacanear.
Ainda nessa sequência inicial, fica claro que o Batman tem uma política de tolerância zero com qualquer crime ou infração que ele encontra em Gotham. Dos bandidos que saem espancando pessoas aleatoriamente até pichadores de banco, o símbolo do morcego é algo que impõe medo a qualquer um que esteja fazendo coisa errada. Exceto, é claro, se você for rico e poderoso. Nesse caso, você pode traficar drogas na frente do herói que ele não vai fazer nada.
Isso fica evidente quando o personagem vai até o Iceberg Lounge para falar com o Pinguim e encontra o mafioso vendendo drogas para Selina e ele simplesmente não faz nada. O homem que sai por aí quebrando a cara de aviãozinho nas ruas de Gotham testemunhou um dos chefões do crime organizado e não disse nada. Apenas olhou feio para a negociata, deu uma flertada com a Mulher-Gato e deixou por isso mesmo.
É claro que ele tinha um interesse maior naquele momento, mas não custaria nada inserir uma linha de diálogo ou cena qualquer em que ele age para impedir o tráfico ali. Podia ter batido mais no Pinguim ou feito algo para interromper a venda de gota que ele viu acontecer na sua frente e não falou absolutamente nada.
Morcegão para o vendedor nas ruas, mas tchutchuca para os verdadeiros lordes do crime, não é senhor Batman?
O plano do Charada (Paul Dano) para expor o promotor Gil Colson (Peter Sarsgaard) é bem simples: ele sequestrou o agente da lei, colocou uma bomba em seu pescoço e o amarrou em um carro jogado no meio do funeral do prefeito de Gotham. Chegando lá, o vilão passou a ligar para o telefone amarrado à sua vítima para poder fazer seus jogos sádicos.
Tudo isso é muito legal, exceto pelo fato de que o Charada passou algumas horas telefonando até que alguém tivesse coragem de atender a ligação. E, se você pensar bem nisso, a cena toda se torna bem ridícula.
Lembre bem da passagem de tempo nesse momento: o funeral do político acontece ao entardecer, já que vemos Bruce (Pattinson) chegando ao local ainda com o sol aparecendo. Quando o carro invade, temos a silhueta do Charada aparecendo contra a luz da janela — e fica claro que isso acontece durante o dia. Só que, quando o esquadrão antibombas isola o local e o Batman chega, já anoiteceu.
Não fica claro quanto tempo passou entre o surgimento de Colson e a aparição do Batman, mas podemos considerar que não foi algo rápido — coisa de uma hora, talvez. E, durante todo esse tempo, o Charada ficou ligando para o celular que ele amarrou no promotor.
Em termos de roteiro, a cena funciona. Só que, se você pensar na parte prática da coisa, fica claro em como tudo ficou zoado. Imagine a cena sob o ponto de vista do Charada, com ele ligando dezenas de vezes para aquele telefone até cair na caixa postal, obrigando a fazer uma nova ligação — até que o Batman finalmente aparece para pedir que alguém atenda o bendito celular.
A primeira aparição do Batmóvel é realmente incrível, com o herói acelerando freneticamente o veículo só para fazer barulho, queimar gasolina e fazer todo mundo ficar com medo. Só que, mais uma vez, a composição da cena não faz nenhum sentido.
Primeiro, porque ela implica que o Batman chegou de Batmóvel no local onde a gangue do Pinguim estava escondida, encontrou um local para estacionar e deixou aquele carro tremendamente barulhento na vaga que era literalmente ao lado do covil. Lembre-se de que o plano não era usar o veículo e que isso só foi necessário para tentar virar o jogo.
Além disso, toda a disposição da cena não se encaixa. O herói leva um tiro de escopeta no peito e cai no chão atrás de um carro. Quando o Pinguim chega até o local para finalizar o herói, vê que ele não está mais ali e há toda a apresentação do Batmóvel.
Acontece que tudo isso acontece em meio a um pátio aberto e, para sair do local em que estava até chegar ao seu possante tunado, o Batman teria que ser visto por alguém. Seria impossível um homem de 1,85m — altura de Robert Pattinson — vestido de morcego e tremendamente machucado fazer esse trajeto sem ser visto. É isso ou o personagem tem teleporte.
Toda a perseguição do Batman ao Pinguim é realmente muito boa. A trilha sonora é incrível, as loucuras que ele faz com o Batmóvel são impressionantes e não há como não se empolgar quando a gente vê o carro saindo do meio das chamas. Só que você parou para pensar na quantidade de gente que morreu só nessa cena?
Um engavetamento é sempre uma tragédia no trânsito, mas o que vimos em Gotham é algo realmente impressionante. Pelo menos dois caminhões se envolveram no acidente e um deles chegou a explodir, o que significa que uma dezena de outros veículos que estavam naquela rodovia também foram atingidos — gente que não tinha nada a ver com o crime organizado, a venda de drogas ou o plano do Charada. Era o cidadão comum que estava voltando para casa e que deu o azar de encontrar o Batmóvel no caminho.
São dezenas de mortos e o Batman não dá a mínima para isso. Ele está tão focado em pegar o Pinguim, que nem sequer vê o tamanho do estrago no retrovisor. E olha que essa versão do herói é bem fiel à ideia de não matar, tanto que chega a salvar um policial corrupto da ira da Mulher-Gato. Só que, no trânsito, ele parece não se importar muito.
E o mais engraçado é que toda essa mortandade não serviu para nada. Como vemos na cena seguinte, o Pinguim não tinha nada a ver com o Charada, o que faz com que todas aquelas mortes na rodovia não servissem para nada.
Fonte: Canaltech
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