Ucranianos e russos tem versões diferentes, mas confirmam o fato: ontem, (13 de abril) o cruzador de mísseis Moskva foi tomado por um fogo catastrófico e explosões de munição. O navio russo se encontrava no Mar Negro, a cerca de 100 km ao sul da cidade portuária ucraniana de Odessa.
Com 186 metros de comprimento, e 12.490 toneladas, trata-se do maior e mais importante navio da Frota do Mar Negro – a parte envolvida na guerra com a Ucrânia da Marinha da Rússia.
Maior navio na região
Cruzador é o nome que se dá para os navios que correspondem hoje à função dos grandes couraçados até a Segunda Guerra: são os maiores navios de combate de uma marinha, só menores que os porta-aviões (que tem alguns sistemas de defesa, mas não realizam combate eles mesmos). A Marinha do Brasil não conta atualmente com nenhum deles (ou porta-aviões).
Hoje em dia, o trabalho é feito por mísseis, não canhões. Cruzadores de mísseis atuam como grandes baterias de defesa antiaérea e antinaval para o resto da frota, atuando como uma espécie de porto-seguro. O Mosvka, cujo nome significa simplesmente Moscou em russo, foi comissionado pela URSS em 1983, passou por dez anos de reformas, e foi lançado novamente pela Rússia em 2000.
O Moskva era também o navio-almirante da Frota do Mar Negro – o “chefe”, de onde as operações são coordenadas.
Em alguns casos, o navio-almirante é puramente cerimonial: a fragata USS Constitution, lançada em 1797 e ainda navegando com suas velas, é o navio-almirante da Marinha dos Estados Unidos. No caso da Rússia, a função é prática: o navio-almirante da Marinha da Rússia como um todo é o porta-aviões Admiral Kuznetsov, que já esteve no Mar Negro, mas atualmente está em reformas num estaleiro em Murmansk, no Oceano Ártico. O Moskva era a “autoridade local” da Frota do Mar Negro.
A ideia de um navio-almirante é que não enfrente combate direto para nunca ser atingido, quanto menos afundado. Daí navios de longo alcance, como porta-aviões, porta-helicópteros (caso do brasileiro NAM Atlântico) e cruzadores de mísseis geralmente serem escolhidos para a função. Mas qualquer navio em que os altos oficiais estejam atuando se torna o navio-almirante.
Situação incerta do navio russo
O status atual do Moskva é incerto. Ucranianos afirmaram ontem à noite que o cruzador, atingido por um míssil partido de terra, havia emborcado e estava afundando. Russos disseram que fora evacuado, estava flutuando e sendo rebocado. O Departamento de Defesa dos EUA deu uma notícia estranhamente mais otimista que a dos russos: falou que imagens de satélite revelam o navio se movendo por meios próprios (isto é, sendo tripulado) rumo ao porto de Sebastopol, para reparos.
No mínimo, o navio-almirante russo sofreu um nocaute: o fogo em um navio cheio de munições, ainda mais se evacuado, sem ninguém para tentar controlar, é uma notícia gerlamente fatal.
Os russos dizem que o que aconteceu ontem foi um fogo acidental que levou à explosão de munições. Os ucranianos tem uma versão bem mais heroica (naturalmente): o navio foi atingido por uma novíssima arma ucraniana, que nunca tinha sido usado em combate.
Nova arma da Ucrânia
É o P-360 Neptun (Нептун; Netuno, deus do mar), derivado do projeto soviético, usado atualmente pela Rússia, KH-35 Uran (Urano). É uma versão com avanços em sistemas eletrônicos e maior alcance, e que entrou em status operacional há pouco mais de um ano.
O Neptun é um míssil de cruzeiro. Quer dizer que ele tem voo sustentado, como um avião, e não é disparado para o alto para cair com a força da gravidade, como um míssil balístico. Ele voa perto da superfície do mar, movido por motores a jato e abaixo da velocidade do som, de forma a evitar a detecção por radar.
Com uma ogiva de 150 kg de alto explosivo, o Neptun é capaz de causar um grande estrago num navio, potencialmente fatal se atinge (como parece ter atingido) seus depósitos de munições. Mas não é infalível.
Navios modernos como o Moskva usam de defesas computadorizadas – os sistemas de armas de defesa próxima (chamados pela sigla em inglês CWIS). São torres com metralhadoras giratórias de alta capacidade de disparo para atingir os mísseis se aproximando. O cruzador russo portava seis CWIS AK-630 (com capacidade para 5 mil disparos por minuto, cada um), mas não conseguiu se defender.
Duas coisas pesavam contra ele: o Mar Negro estava numa tempestade, o que torna difícil ao sistema de radar diferenciar um míssil voando baixo das cristas das ondas. E os ucranianos parecem ter usado de um estratagema: segundo sua versão, eles voaram com um drone turco Bayraktar TB2 em volta do navio.
Isso teria cumprido duas funções: a primária é identificar o alvo. A secundária, e crucial, foi distrair os russos: com uma ameaça no ar (o TB2 pode portar mísseis), seu radar direcional, mais preciso, possivelmente foi usado para acompanhar o drone, e falhou em captar o míssil.
Grande vitória, mesmo se moral
O Moskva, se confirmada sua destruição, é a maior perda naval em combate desde a Segunda Guerra, quando as marinhas do Japão e EUA travaram a maior campanha naval da história no Oceano Pacífico. Em combates assimétricos como os vistos depois da Segunda Guerra, grandes navios raramente são atingidos de forma séria. Forças de insurgência não tem nem esses navios nem o potencial de destruí-los. A última grande perda de navio foi o cruzador argentino ARA General Belgrano, afundado na Guerra das Malvinas, em 1982, destruído por um submarino britânico.
Mas o Belgrano era um navio da Segunda Guerra americano adaptado, de um país enfrentando um adversário muito acima de sua categoria de peso. O Moskva era simplesmente o navio mais importante da frota russa no Mar Negro, e o peso-pesado, a Rússia, é quem perdeu.
E perdeu mesmo se confirmada a versão mais branda, de que sofreu danos sérios, mas ainda está flutuando. E mesmo se foi um acidente, como os russos dizem ser. O navio russo está, para todos os fins, fora de ação. Sua perda prática torna a posição da Rússia no mar muito menos confortável, porque seu trabalho era justamente evitar que mísseis como o Neptun (e aviões e drones ucranianos) atingissem outros navios russos menos protegidos.
E há ainda a perda moral: a Rússia simplesmente teve seu navio-almirante nocauteado, quase certamente com perda de vidas, que vão se acumulando numa campanha que está se revelando muito mais difícil do que os russos inicialmente deviam prever. Na situação dos russos, perder o moral pode significar perder a guerra.
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Fonte: Olhar Digital
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