Com o crescimento do turismo espacial, a ideia de viver uma aventura recreativa no cosmos começa a soar bem mais possível do que se poderia pensar há algumas décadas. Isso acaba mexendo com a imaginação das pessoas em relação ao que poderiam ser experiências interessantes de se vivenciar por lá. E o uso de drogas, como a maconha, é uma dessas ideias.

Ex-astronauta acredita que o uso recreativo de maconha no espaço pode ser interessante, mas não neste momento. Imagem: Dmytro Tyshchenko – Shutterstock

“As pessoas têm mastigado cogumelos e vários tipos de raízes e frutos desde sempre”, disse o ex-astronauta canadense Chris Hadfield, em entrevista ao site Futurism. “E por isso há sempre um lugar na sociedade ou no comportamento humano para essas coisas”.

Ao longo de sua carreira, Hadfield voou no ônibus espacial da NASA e na nave russa Soyuz, além de passar um tempo tanto a bordo da estação espacial russa Mir quanto da Estação Espacial Internacional (ISS). Ele se tornou uma sensação nas redes sociais ao postar fotos e vídeos de sua vivência na ISS, e até lançando um álbum de músicas de guitarra gravadas lá.

Uma dessas postagens gerou uma montagem que mostra Hadfield segurando um grande saco de maconha no espaço, com um dedo tocando em seus lábios fazendo um sinal de segredo. Na verdade, no entanto, o saco que ele segurava continha ovos de Páscoa.

Postagem feita pelo ex-astronauta Chris Hadfield gerou uma montagem na qual ele estaria segurando um saco de maconha dentro da Estação Espacial Internacional (ISS). Imagem: Reprodução Redes Sociais

Hadfield, que levou a brincadeira numa boa, explica que, atualmente, seria impossível fumar maconha no laboratório orbital. “Na estação espacial, se houver uma emergência, a tripulação é o corpo de bombeiros”, disse ele. “Você não pode ter se intoxicado ou se embriagado ou o que quer que seja, porque se algo der errado, então você vai morrer”.

Conselheiro de empresa biotecnológica que trabalha com cannabis

Mas isso não significa que ele não veja essa possibilidade no futuro. “Uma vez que a população [no espaço] fique grande o suficiente, uma vez que você chegar a uma situação estável o bastante, as pessoas vão querer, você sabe, uma bebida. As pessoas vão querer um pouco de maconha”.

No ano passado, Hadfield se juntou aos membros do conselho de uma empresa de biotecnologia chamada BioHarvest, que, segundo ele, “trabalha com cannabis há anos”.

Chris Hadfield foi astronauta da NASA, tendo participado de missões na estação espacial russa Mir e na Estação Espacial Internacional. Imagem: NASA

O ex-astronauta disse que a empresa encontrou uma nova maneira de usar biorreatores para cultivar tricomas, que são a “pequena parte ativa que você está realmente tentando semear”.

Em outras palavras, em vez de desperdiçar gastos com água, pesticidas e outros recursos necessários para cultivar a planta, os biorreatores poderiam permitir que futuros astronautas semeassem diretamente a parte proveitosa. “Na verdade, está replicando o processo natural de crescimento da parte que é útil para nós, mas sem toda a planta”, explicou Hadfield.

Em agosto, a BioHarvest anunciou que havia encontrado uma nova maneira de criar estruturas estáveis semelhantes a corais de múltiplas casas de cannabis, um processo que, segundo a empresa, poderia potencialmente “revolucionar a produção de cannabis”.

Hadfield foi rápido em apontar que, embora possa haver certamente um interesse no uso recreativo da cannabis no espaço, não é a “intenção original” da tecnologia da BioHarvest, apesar de ter “grande potencial”, conforme destaca.

Além disso, o CEO da BioHarvest, Ilan Sobel, atentou ao fato de que “a substância ainda não está regulamentada” para a Estação Espacial Internacional. “Mas, uma vez que a cannabis se torne federalmente legal em todo os EUA, o processo de cultivo de canabinoides da BioHarvest pode apresentar um avanço de uma perspectiva científica biológica em um ambiente de microgravidade”, disse Sobel.

Ele destaca que o espaço pode ser o ambiente perfeito para produzir canabinoides de nível medicinal. “Vemos a capacidade potencial de que canabinoides menores valiosos sejam cultivados em quantidades significativamente maiores em comparação com seu crescimento na Terra”.

Por enquanto, a ênfase não está no uso recreativo, mas sim em aplicações médicas. “Essas composições únicas de cannabis de espectro completo podem ter um valor significativo no fornecimento de soluções de tratamento mais otimizadas para muitas doenças paliativas, onde os compostos sintetizados atuais da farmacêutica não estão fornecendo soluções adequadas”, disse Sobel.

Uso recreativo da maconha no espaço não é o foco

No momento, a BioHarvest está concentrando seus esforços em fornecer aos futuros viajantes espaciais nutrientes aprimorados à microgravidade, em vez de uma maneira de se drogar. Para isso, a empresa está trabalhando com outra startup, chamada Space Tango, para modificar seus biorreatores para uso na ISS.

Segundo a BioHarvest, produtos como vinia, um suplemento derivado de células de uva vermelha, têm sido clinicamente testados para trazer benefícios cardiovasculares significativos. “Isso pode ser uma benção para os astronautas, que são obrigados a estar em condições físicas máximas o tempo todo durante suas viagens espaciais”, declarou Sobel.

“A grande vantagem para o crescimento de células em um meio de cultura é que, para uma determinada caloria de energia, ou para uma determinada dose de nutriente, é mais eficiente em termos de massa e volume”, disse o CEO do Space Tango, Alain Berinstain. “Também é possível que o cultivo de nutrientes seja necessário para os viajantes espaciais em viagens de longa duração”.

Isso é mais ou menos o que chamou a atenção de Hadfield também. “O que realmente me atraiu à BioHarvest foi a escalabilidade da plataforma de biotecnologia e como ela pode resolver muitos dos problemas agrícolas que enfrentamos na alimentação de 10 bilhões de pessoas”, disse ele, completando que os canabinóides são apenas uma das coisas que a empresa cultiva. 

Sobre o consumo de maconha de forma recreativa no espaço, Hadfiled acredita que “ainda existe um longo caminho”.