Sexta-feira, Novembro 22, 2024
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O que é a ‘cristianização’ na política e qual a relação deste fenômeno com a pré-candidatura de Doria

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Termo é usado para quando um partido abandona seu candidato oficial para dar suporte a outro com mais chances de ganhar; ex-governador está sendo abandonando por seus correligionários, que defendem Tebet

Em 1950, o PSD lançou Cristiano Machado como candidato à Presidência da República, mas, ao decorrer da campanha, parte do partido passou a apoiar Getúlio Vargas (PTB). Foi a partir desse episódio que o mundo político cunhou o termo “cristianização”, fenômeno que ocorre quando a legenda abandona seu postulante oficial para dar suporte a um outro com mais chances de vitória. A situação se assemelha com a vivenciada por João Doria, pré-candidato do PSDB, que está sendo rifado pela cúpula tucana e preterido pela senadora Simone Tebet (MDB), escolhida para ser a cabeça de chapa da candidatura da chamada terceira via. Há, no entanto, duas diferenças principais na situação do ex-governador quando comparada com a de Machado.

A primeira é que, no episódio de 1950, o PSD manteve a candidatura do mineiro ao Palácio do Planalto até o fim. No caso de Doria, o PSDB largou o ex-governador de São Paulo ao relento antes mesmo do período eleitoral oficialmente começar. “O processo da cristianização pressupõe a formalização da candidatura, ou seja, do candidato ser oferecido ao eleitor. Aqui, o processo é outro, porque Doria ainda não foi apresentado ao eleitorado. É uma disputa interna partidária. Não me parece correto falar em cristianização da candidatura do Doria”, opina a cientista política Lara Mesquita, pesquisadora da FGV. Em entrevista à Jovem Pan, a especialista explica que o que Doria está vivendo é um processo anterior à cristianização.

Para se defender do que chama de “golpe”, o ex-gestor paulista bate na tecla de que foi escolhido candidato durante as prévias partidárias do PSDB, porém, o fato é que sua postulação ainda não foi oficializada na convenção da sigla. Desde março, a cúpula tucana deixa bem claro que o representante da terceira via será escolhido em conjunto com o MDB e Cidadania, em uma tentativa de acabar com a polarização entre Lula (PT) e Jair Bolsonaro (PL). O União Brasil fazia parte do movimento do autointitulado “centro-democrático”, mas pulou do barco no fim das negociações e decidiu lançar o deputado federal Luciano Bivar (PE) à corrida presidencial, restando ao grupo apenas Tebet e Doria como opções. Na última quarta-feira, 18, os presidentes e outros líderes das legendas se reuniram em Brasília para analisar os resultados das pesquisas quantitativas e qualitativas encomendadas pelo grupo. Após a análise dos dados, os caciques deliberaram que a parlamentar tem maior capacidade de angariar votos, em especial, por uma razão: a emedebista tem uma das menores rejeições entre todos os presidenciáveis. Como Tebet ainda não figura na lista dos postulantes mais conhecidos pela população, entusiastas de sua candidatura veem um potencial de crescimento nas pesquisas nos próximos meses. Diante do impasse, há uma questão a ser respondida: o que levou o PSDB a rifar a pré-candidatura de Doria e sustentar uma postulação emedebista?

João Doria foi escolhido como pré-candidato do PSDB em 27 de novembro de 2021. O paulista concorreu com o na época governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, e com o ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio. Cerca de seis meses depois, Doria continua estacionado e com ínfimas intenções de voto. À Jovem Pan, um integrante da Executiva Nacional do PSDB ironizou o desempenho do ex-governador de São Paulo nas pesquisas. “O esforço de Doria é inútil, o bloco está na rua há mais de cinco meses e ele não só não cresce como cai nas pesquisas”, disse sob reserva um tucano da velha guarda. “Talvez o PSDB tenha feito essas prévias muito cedo. Se acreditava, naquele momento, que o Doria tinha condições de crescer. Ele pode ter perdido apoio entre dirigentes, que não viram essa expectativa de crescimento concretizadas”, analisa a cientista política. Na pesquisa do Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe) divulgada nesta sexta-feira, 20, o ex-gestor tem 5% dos votos. A margem de erro do levantamento é de 3,2 pontos percentuais para mais ou para menos. O pior resultado do PSDB em uma eleição presidencial foi em 2018, quando Geraldo Alckmin terminou em terceiro, com 5%.

Para Lara, no entanto, os cenários de 2018 e 2022 são diferentes e não podem ser comparados. “O Alckmin encerrou a corrida presidencial com 5% dos votos, mas ninguém esperava, não era algo previsível. Tanto que o PSDB e o Alckmin conseguiram fazer a maior coligação, vários partidos do Centrão estavam na chapa presidencial do Alckmin. Em 2018, a gente tinha uma expectativa, antes do processo eleitoral, de reproduzir a polarização PT-PSDB de 2014, o que não se concretizou. É por isso que o Alckmin foi abandonado pelas elites políticas. Ele foi cristianizado”, explica a cientista política. Na última eleição presidencial, o próprio João Doria abandonou Alckmin, seu padrinho político, se aliou a Jair Bolsonaro e lançou a dobradinha “BolsoDoria”. “Em 2022, o Doria não não cresceu nas campanhas, como ninguém acredita que ele vai crescer durante a campanha. Ele não tem a confiança, não tem ninguém apostando na sua candidatura”, acrescenta a especialista. 

Lara Mesquita também aponta que Doria foi incapaz de costurar alianças com a alta cúpula do PSDB. Nas prévias de 2021, as regras aprovadas determinaram que os votos dos filiados ao partido teriam peso igual ao dos votos daqueles que possuem mandato político. Ou seja, os aliados partidários de Doria, que não possuem mandato político, garantiram sua vitória nas prévias e, durante esses seis meses, o agora ex-governador não foi capaz de driblar a resistência interna da ala dos tucanos históricos, que conta com políticos de fora de São Paulo, como o senador Tasso Jereissati (CE) e o ex-ministro e ex-deputado federal por Minas Gerais Pimenta da Veiga, por exemplo. Outros apoiadores de Doria acabaram saindo do PSDB durante a janela partidária, enfraquecendo a rede de apoio do paulista. Há, ainda, uma avaliação de que a alta rejeição do tucano – de acordo com a pesquisa Ipespe, 53% dos eleitores não votariam em Doria de jeito nenhum, patamar que só é inferior aos 59% de Bolsonaro – inviabiliza a candidatura do governador Rodrigo Garcia (PSDB) ao Palácio dos Bandeirantes. São Paulo é a joia da coroa do partido, que está à frente do Estado desde 1994.

O terceiro ponto que motiva a fritura de Doria são os altos gastos de financiamento de uma campanha presidencial. Parte dos dirigentes da elite tucana rejeita a hipótese de destinar parte dos recursos do partido, que não são tão expressivos, para uma candidatura natimorta. Em 2018, a bancada do PSDB na Câmara encolheu 46,3%, diminuindo drasticamente a verba eleitoral destinada à sigla. “Tem uma parcela do partido que acha que não faz sentido alocar uma quantidade tão grande de recursos uma campanha presidencial e um candidato que não esse mostrando viável. Seria mais eficiente realocar esse recurso nas campanhas de deputados, senadores e governadores. Pesa, sobretudo, porque os partidos precisam ter um desempenho mínimo eleitoral para conseguir ter acesso aos recursos públicos. Esse desempenho é mensurado a partir da bancada da Câmara dos Deputados”, detalha Lara. Ao longo desta semana, o presidente nacional do PSDB, Bruno Araújo, disse que, ao final deste processo, prevalecerá a unidade da sigla. Com uma crise atingindo em cheio o ninho tucano, resta perguntar ao dirigente partidário se ele, de fato, acredita nesta projeção. 

Fonte: Jovem Pan News

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