Há duas semanas, o Olhar Digital noticiou que astrônomos da Universidade da Califórnia-Berkeley acreditam ter encontrado o que deve ser o primeiro buraco negro desgarrado da história. Agora, uma segunda equipe de cientistas da mesma instituição, conduzindo uma análise separada e independente, alcançou quase o mesmo resultado, adicionando peso à ideia de que identificamos um buraco negro livre – ou algo assim – vagando pela Via Láctea.
Liderado pelos astrônomos Casey Lam e Jessica Lu, o novo trabalho apresenta uma “pequena” diferença na conclusão em relação ao anterior, no entanto. Segundo a nova abordagem, dada a faixa de massa do objeto, ele pode ser uma estrela de nêutrons, em vez de um buraco negro.
De qualquer forma, isso significa que podemos ter uma nova ferramenta para procurar objetos compactos ‘escuros’, que são indetectáveis em nossa galáxia, medindo a forma como seus campos gravitacionais dobram e distorcem a luz de estrelas distantes à medida que passam na frente deles, técnica chamada microlente gravitacional. “Este é o primeiro buraco negro flutuante livre ou estrela de nêutrons descoberto com microlente gravitacional”, disse Lu.
Buraco negro ou estrela de nêutrons? No fim, tanto faz
“Com esse método, somos capazes de sondar esses objetos solitários e compactos e pesá-los. Acho que abrimos uma nova janela para esses objetos escuros, que não podem ser vistos de outra maneira”, declarou a cientista.
Os buracos negros são teorizados para serem os núcleos colapsados de estrelas massivas que chegaram ao fim de suas vidas e ejetaram seu material externo. Acredita-se que tais estrelas precursoras do buraco negro – maiores que 30 vezes a massa do Sol – tenham vidas relativamente curtas.
De acordo com as melhores estimativas, deve haver entre 10 milhões e 1 bilhão de buracos negros de massa estelar no espaço, à deriva, navegando silenciosamente através da galáxia.
Mas como não emitem nenhuma luz que possamos detectar, eles são quase impossíveis de serem observados. A menos que haja matéria caindo em seu interior, um processo que gera raios-X no espaço ao redor do buraco negro. Do contrário, se um buraco negro está apenas viajando, sem fazer nada, nós quase não temos nenhuma maneira de detectá-lo.
Quase. Duas pesquisas separadas sobre microlentes gravitacionais – a Optical Gravitational Lensing Experiment (OGLE) e a Microlensing Observations in Astrophysics (MOA) – registraram independentemente um evento que acabou atingindo o pico em 20 de julho de 2021.
Esse evento foi nomeado MOA-2011-BLG-191/OGLE-2011-BLG-0462 (abreviado para OB110462), e por ser extraordinariamente longo e brilhante, os cientistas se abrigaram para um olhar mais atento.
“Quanto tempo dura o evento de brilho é uma dica de quão maciça é a lente em primeiro plano que dobra a luz da estrela de fundo”, explica Lam. “Eventos longos são mais prováveis de serem atribuídos a buracos negros. Não é uma garantia, porém, porque a duração do episódio de brilho não depende apenas de quão maciça é a lente em primeiro plano, mas também de quão rápido a lente em primeiro plano e a estrela de fundo estão se movendo em relação um ao outro”.
No entanto, segundo o cientista, “ao também obter medidas da posição aparente da estrela de fundo, podemos confirmar se a lente em primeiro plano realmente é um buraco negro”. Neste caso, observações da região foram feitas em oito ocasiões distintas usando o Telescópio Espacial Hubble, até 2017.
A partir de uma análise profunda desses dados, uma equipe de astrônomos liderados por Kailash Sahu, do Space Telescope Science Institute, concluiu que o culpado era um buraco negro microlente de 7,1 vezes a massa do Sol, a 5.153 anos-luz de distância.
A análise de Lu e Lam agora adiciona mais dados do Hubble, capturados em 2021. Sua equipe descobriu que o objeto é um pouco menor, entre 1,6 e 4,4 vezes a massa do Sol, o que significa que o objeto pode ser uma estrela de nêutrons. Esse também é o núcleo em colapso de uma estrela massiva, que começou entre 8 e 30 vezes a massa do Sol.
O objeto resultante é apoiado por algo chamado pressão de degeneração de nêutrons, pelo qual os nêutrons não querem ocupar o mesmo espaço; isso evita que ele entre em colapso completamente em um buraco negro. Tal objeto tem um limite de massa de cerca de 2,4 vezes a massa do Sol.
Curiosamente, nenhum buraco negro foi detectado abaixo cerca de 5 vezes a massa do Sol. Isso é referido como a menor lacuna de massa. Se o trabalho de Lam e seus colegas estiver correto, isso significa que podemos ter a detecção de um objeto de lacuna de massa inferior em nossas mãos.
As duas equipes voltaram com massas diferentes para o objeto de lente porque suas análises retornaram resultados diferentes para os movimentos relativos do objeto compacto e da lente estelar.
Sahu e sua equipe descobriram que o objeto compacto está se movendo a uma velocidade relativamente alta de 45 quilômetros por segundo, como resultado de um nascimento violento: uma explosão de supernova desordenada pode enviar o núcleo colapsado em altíssima velocidade.
Lam e seus colegas observaram 30 quilômetros por segundo, no entanto. Esse resultado, dizem eles, sugere que talvez uma explosão de supernova não seja necessária para o nascimento de um buraco negro.
No momento, é impossível tirar uma conclusão precisa sobre o OB110462, mas os astrônomos esperam aprender muito com a descoberta de mais desses objetos no futuro. “Seja o que for, o objeto é o primeiro remanescente estelar escuro descoberto vagando pela galáxia desacompanhado por outra estrela”, diz Lam.
A pesquisa foi aceita para publicação pelo The Astrophysical Journal e está disponível no servidor de pré-impressão arXiv.
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Fonte: Olhar Digital
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