Pesquisadores da Universidade do Texas-Austin, nos EUA, fizeram uma análise inédita de alguns vírus que infectam um grupo de micróbios que podem incluir os ancestrais de toda a vida complexa. Os resultados do estudo foram publicados nesta segunda-feira (27) na revista Nature Microbiology.

A descoberta oferece pistas tentadoras sobre as origens da vida e sugere novas direções para explorar a hipótese de que os vírus foram essenciais para a evolução dos seres humanos e outras formas de vida complexas.

Pesquisadores da UT Austin usaram o submersível Alvin para coletar amostras de sedimentos e micróbios a partir de 2000 m de profundidade no Golfo da Califórnia. Crédito: Brett Baker

Há uma hipótese de que todas as formas de vida complexas, como os humanos e demais seres eucariontes (seres vivos com células eucarióticas, ou seja, com um núcleo celular cercado por uma membrana e com várias organelas) se originaram quando arqueias e bactérias se fundiram para formar um organismo híbrido.  

Também chamadas de arqueobactérias, as arqueias são seres vivos unicelulares morfologicamente semelhantes às bactérias, mas genética e bioquimicamente tão distintas destas como dos eucariontes. Segundo pesquisas recentes, os primeiros eucariontes são descendentes diretos dos chamados Asgard archaea, um subgrupo de arqueias.

Agora, o estudo liderado por Ian Rambo, que foi sua tese de doutorado pela UT Austin, esclarece como os vírus também podem ter desempenhado um papel nessa história de bilhões de anos.

“Esta pesquisa está abrindo uma porta para melhor resolver a origem dos eucariontes e entender o papel dos vírus na ecologia e evolução das arqueias asgard”, disse Rambo. “Há uma hipótese de que os vírus podem ter contribuído para o surgimento de uma vida celular complexa”.

Ele se refere a uma teoria muito debatida chamada eucariogênese viral, que sugere que, além de bactérias e arqueias, os vírus podem ter contribuído com algum componente genético para o desenvolvimento de eucariontes. Embora não seja a confirmação dessa hipótese, as descobertas de Rambo e sua equipe oferecem algumas pistas interessantes.

Vírus descoberto tem características únicas

Os vírus recém-descobertos infectando as arqueias asgard têm algumas características semelhantes a vírus que atingem eucariontes, incluindo a capacidade de copiar seu próprio DNA e sequestrar sistemas de modificação de proteínas de seus hospedeiros. 

Como esses agentes infecciosos apresentam características de vírus que contaminam eucariontes e procariontes (organismos com células sem núcleo), eles são únicos, pois não são exatamente como aqueles que infectam outras formas de vida complexas.

Vírus com genomas semelhantes são agrupados, incluindo aqueles que infectam bactérias (à esquerda) e eucariontes (no centro direito e inferior). Os vírus que infectam arqueias asgard são únicos, segundo o estudo. Crédito: Universidade do Texas-Austin

“O mais emocionante é que são tipos totalmente novos de vírus que são completamente diferentes daqueles que já vimos antes em arqueias e eucariontes, infectando nossos parentes microbianos”, disse Brett Baker, professor associado de ciência marinha e biologia integrativa e autor correspondente do estudo.

As arqueias asgard, que provavelmente evoluíram há mais de 2 bilhões de anos e cujos descendentes ainda vivem, foram descobertas em sedimentos marinhos profundos e fontes termais ao redor do mundo, mas até agora apenas uma cepa foi cultivada em laboratório. Para identificá-las, os cientistas coletam seu material genético do ambiente e, em seguida, juntam seus genomas. 

No recente estudo, os pesquisadores escanearam os genomas de arqueias asgard para repetir regiões de DNA conhecidas como matrizes CRISPR, que contêm pequenos pedaços de DNA viral que podem ser precisamente combinados com vírus que infectaram anteriormente esses micróbios. 

Essas “impressões digitais” genéticas permitiram identificar esses invasores virais furtivos que infectam organismos com papéis-chave na complexa história de origem dos eucariontes.

“Agora estamos começando a entender a implicação e o papel que os vírus poderiam ter tido no quebra-cabeça da eucariogênese”, disse Valerie De Anda, pesquisadora associada da UT Austin e coautora do estudo.

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