Lançado no natal de 2022, o Telescópio Espacial James Webb (JWST) não só já está devidamente instalado em sua morada no espaço, no Segundo Ponto de Lagrange (L2) entre a Terra e o Sol, a 1,5 milhão de km do nosso planeta, como também já começou suas observações científicas.
Conforme divulgado na última terça-feira (12), as primeiras imagens feitas pelo observatório de próxima geração da NASA (em parceria com as agências espaciais canadense e europeia) são de uma qualidade e alcance sem precedentes na história da astronomia. Na ocasião da revelação das imagens ao mundo, o Olhar Digital fez uma transmissão em tempo real pela Internet – e você pode ver ou rever neste link.
No decorrer da última semana, esse foi um dos assuntos mais comentados na mídia (rendendo, inclusive, uma série de memes nas redes sociais – confira aqui). E toda essa repercussão reacendeu uma polêmica em torno do nome escolhido para batizar o equipamento, já que faz referência a uma figura controversa da história da agência espacial norte-americana e dos EUA.
Para quem não se lembra ou não teve conhecimento do assunto, noticiado pelo Olhar Digital em outubro, mesmo após apelo da opinião pública, de diversos astrônomos e até de funcionários para que o nome do telescópio fosse trocado, a NASA decidiu manter a homenagem ao seu ex-administrador James Webb, sobre quem pesam acusações de ter cometido crime de homofobia.
Embora esteja feliz diante do sucesso da operação do telescópio espacial, parte da comunidade científica ainda não se conforma com a escolha do nome de Webb. “Muitos astrônomos estão muito infelizes pelo observatório ter o nome dele. É difícil querer usar um instrumento com o nome de alguém que trabalhou para negar sua existência”, escreveu o astrônomo Phil Plait em sua newsletter, Bad Astronomy.
Entenda a polêmica em torno do nome do Telescópio James Webb
James Webb foi o segundo administrador da NASA. Entre 1961 e 1968, ele supervisionou o programa Apollo, que pousou humanos na Lua, e defendeu bravamente a agenda científica da NASA, sendo essa a motivação citada em 2002, quando o então administrador Sean O’Keefe decidiu dar seu nome ao que estava sendo chamado, até então, apenas de Telescópio Espacial de Próxima Geração.
Os pedidos para que o projeto fosse renomeado foram inúmeros, baseados em avaliações de que, durante o tempo de Webb no governo federal, ele alimentou a discriminação contra pessoas LGBTQIA+, em uma operação que foi apelidada de Pânico Lavanda. Ele também é acusado de ter permitido que a segurança da agência espacial americana interrogasse funcionários no passado por serem homossexuais.
Diante dos protestos, a NASA abriu uma investigação e, ao anunciar a decisão de manter o nome, o atual administrador da agência, Bill Nelson, foi acusado de ter sido superficial nas justificativas, o que, até hoje, não foi aceito pelos críticos.
“A declaração do administrador foi que, naquela época, não havia nenhuma evidência que nos levasse a mudar o nome”, disse Paul Hertz, chefe da divisão de astrofísica da agência, em uma reunião do Comitê Consultivo de Astrofísica ocorrida no fim de março deste ano. “A pesquisa não foi concluída, e nós não pretendemos insinuar que tenha sido. Eu sei que a decisão que a NASA tomou é dolorosa para alguns e parece errada para muitos de nós”, disse ele.
Brian Odom, historiador-chefe interino da NASA, que também estava na reunião, se comprometeu a ir pessoalmente até a Biblioteca Presidencial Harry S. Truman, que fica em Independence, no estado americano do Missouri, para analisar documentos da época de Webb como subsecretário de Estado de Truman, de 1949 a 1952, época que ocorreu o Pânico Lavanda. Essa operação foi uma perseguição de funcionários federais LGBTQIA+ que resultou em milhares de pessoas sendo demitidas ou forçadas a renunciar, de acordo com um artigo publicado pela Administração de Arquivos e Registros Nacionais.
“A liderança da NASA levou muito a sério a investigação sobre se o Telescópio Espacial James Webb deve ou não ser renomeado”, disse Hertz. “Reconhecemos que durante décadas a discriminação contra funcionários federais LGBTQIA+ não foi meramente tolerada, foi vergonhosamente promovida por políticas federais”.
Em questão está o papel de Webb nessas políticas. “Vou lá mergulhar nos registros”, disse Odom, tentando “recriar o contexto” dessas ações. “Quando Webb chega ao Departamento de Estado, qual é a atividade que já começou nesta sala? Qual é a reação do Webb a isso? Nós o vemos reagindo a isso? Há evidências em que Webb diz: ‘O que você está fazendo é correto’, [ou] ‘O que você está fazendo é errado’?”.
Além da pesquisa de Odom, a agência contratou um empreiteiro externo para passar por registros semelhantes mantidos pela Administração de Arquivos e Registros Nacionais. “O empreiteiro já esteve na instalação várias vezes e ainda está trabalhando, e Odom pode visitar também”, disse Hertz.
A reunião do comitê ocorreu poucos dias depois que quase 400 páginas de documentos internos da NASA vieram a público. Os documentos, obtidos através de uma solicitação de registros públicos pela Nature, incluíam principalmente e-mails de e para funcionários, oferecendo uma visão das conversas que se desenrolaram sobre o legado de Webb.
Entre os documentos divulgados, há alguns que deixavam explícitas as discriminações. “A NASA decidiu que a remoção de empregados homossexuais seria a sua política. Eles tinham a possibilidade de escolher, durante a administração de Webb, entre manter ou modificar esta política”.
Hertz e Odom enfatizaram que os resultados da pesquisa serão públicos, em contraste com as ações da NASA em setembro passado, quando a agência se recusou a compartilhar quaisquer documentos históricos consultados durante sua investigação sobre Webb.
“Vamos garantir que as pessoas saibam as evidências que tivemos na nossa frente enquanto fazemos essa investigação”, disse Odom. “Esse é o plano para agora; tem sido o meu plano desde o início para fazer isso”.
Ele havia dito, na época, que, até o final de abril, esperava ter uma noção clara dos registros de arquivamento para saber se eles se encaixam na posição que a agência manteve até agora.
Não se sabe se as investigações já foram concluídas. Quando as evidências serão compartilhadas publicamente dependerá do que precisamente os pesquisadores encontrarem. “Se descobrirmos novas evidências, isso realmente muda a linha do tempo”, disse Odom.
Hertz enfatizou que a autoridade para reter ou revisar o nome do Telescópio Espacial James Webb permanece exclusivamente de Nelson. “A nomeação do telescópio é prerrogativa do administrador”, disse ele ao comitê.
Após a divulgação das primeiras imagens, diversos cientistas e entusiastas de astronomia movimentaram a hashtag “#RenameJWST” (“rebatize JWST”, em tradução livre) para pressionar a NASA por uma resposta, mas a agência não emitiu nenhum novo posicionamento sobre isso até o momento.
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Fonte: Olhar Digital
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