Autor de mais de 400 estudos científicos e 15 livros, o médico Carlo Valério Bellieni, neonatólogo e pediatra no Hospital Universitário de Siena, na Itália, decidiu rever toda a literatura disponível sobre riso e humor publicado em inglês nos últimos 10 anos para descobrir por que o ser humano ri.
“Até agora, várias teorias têm procurado explicar o que faz algo ser engraçado o suficiente para nos fazer rir. Estas incluem transgressão (algo proibido), pontuando um senso de arrogância ou superioridade (zombaria), e incongruência – a presença de dois significados incompatíveis na mesma situação”, disse Bellieni em um artigo no site The Conversation, no qual ele descreve sua mais recente pesquisa, publicada nesta quinta-feira (22) na revista Science Direct.
Depois de analisar mais de 100 artigos, ele encontrou uma nova explicação possível. “O riso é uma ferramenta que a natureza pode ter nos proporcionado para nos ajudar a sobreviver”.
Para chegar a essa conclusão, Bellieni focou em artigos de pesquisa sobre teorias do humor que forneceram informações significativas sobre três áreas: as características físicas do riso, os pontos cerebrais relacionados à produção de risos e os benefícios para a saúde.
Organizando todas as teorias em áreas específicas, ele diz que conseguiu condensar o processo do riso em três passos principais: perplexidade, resolução e alívio, que serão explicados mais adiante.
A evolução do riso
De acordo com Bellieni, a teoria da incongruência trata-se de nos depararmos com uma situação específica que subverte nossas expectativas de normalidade.
“Por exemplo, se virmos um tigre passeando por uma rua da cidade, pode parecer incongruente, mas não é cômico – pelo contrário, seria aterrorizante. Mas, se o tigre se enrola como uma bola, então a situação se torna engraçada”, explica o pesquisador.
Bellieni também cita o anti-herói Homer, da série animada Os Simpsons. “Ele nos faz rir quando cai do telhado de sua casa e quica como uma bola ou quando tenta ‘estrangular’ seu filho Bart, com olhos esbugalhados e a língua batendo como se ele fosse feito de borracha”.
Esses são exemplos da experiência humana se transformando em uma versão do mundo exagerada e em desenho animado onde qualquer coisa – especialmente o ridículo – pode acontecer.
“Mas para ser engraçado, o evento também deve ser percebido como inofensivo”, explica Bellieni. “Rimos porque reconhecemos que o tigre ou Homer nunca efetivamente machucaram os outros, nem se machucam, porque essencialmente seus mundos não são reais”.
É aqui que voltamos ao processo de três etapas do riso, mencionado lá em cima. “Primeiro, precisa de uma situação que pareça estranha e induza uma sensação de incongruência (perplexidade). Em segundo lugar, a preocupação ou estresse que a situação incongruente tem provocado deve ser trabalhada e superada (resolução). Terceiro, a liberação real do riso age como uma sirene totalmente clara para alertar os espectadores de que eles estão seguros (alívio)”.
O riso e a fisiologia humana
Assim como chorar, mastigar, respirar ou caminhar, rir é um comportamento rítmico que serve como um mecanismo de liberação para o corpo. Os pontos cerebrais que regulam o riso são os mesmos que controlam as emoções, o medo e a ansiedade. Segundo Bellieni, a liberação do riso quebra o estresse ou a tensão de uma situação e inunda o corpo de alívio.
“O humor é frequentemente usado em um ambiente hospitalar para ajudar os pacientes em sua cura, como os grupos de terapia de palhaços têm mostrado”, disse ele. “O humor também pode melhorar a pressão arterial e as defesas imunológicas, e ajudar a superar a ansiedade e a depressão”.
Pesquisas examinadas no estudo de Bellieni também mostraram que o humor é importante no ensino, sendo usado para enfatizar conceitos e pensamentos. O humor relacionado ao material escolar sustenta a atenção e fornece um ambiente de aprendizagem mais descontraído e produtivo. Em um ambiente de ensino, o humor também reduz a ansiedade, aumenta a participação e a motivação”.
Gostar de quem nos faz rir
Para Bellieni, aquela resposta clichê que as pessoas dão quando perguntadas sobre o que as atrai em alguém – “que me faça rir” – não é só uma questão de gostar de alguém engraçado. “Poderia ser algo mais complexo”, acredita o pesquisador.
“Se o riso de outra pessoa provoca o nosso, então essa pessoa está sinalizando que podemos relaxar, estamos seguros – e isso cria confiança”, explica. “Se nosso riso é desencadeado por suas piadas, tem o efeito de nos fazer superar medos causados por uma situação estranha ou desconhecida. E se a habilidade de alguém de ser engraçado nos inspira a anular nossos medos, estamos mais atraídos por eles. Isso explicaria por que adoramos aqueles que nos fazem rir”.
Bellieni diz que, do ponto de vista evolutivo, esse comportamento humano talvez tenha cumprido uma função importante em termos de consciência de perigo e autopreservação. “Mesmo agora, se passamos por momentos de perigo, muitas vezes reagimos depois com risos devido a um sentimento de puro alívio”.
Fonte: Olhar Digital
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