Andy Lapsa, um ex-funcionário da Blue Origin que trabalhou arduamente para ajudar a avançar o desenvolvimento de alguns dos motores de foguetes mais avançados do mundo, tem pretensões ambiciosas na carreira de engenheiro aeroespacial: ele almeja construir um veículo com design totalmente novo, que possa ser rapidamente reutilizável.
“É o inevitável estado final”, disse Lapsa sobre foguetes de baixo custo capazes de decolar, pousar e voar novamente no dia seguinte. “Isso vai acontecer. É apenas uma questão de quem faz isso e quando”.
Quando trabalhava na empresa de Jeff Bezos, ele ajudou a desenvolver o poderoso motor BE-4, atuando posteriormente como diretor do programa BE-3. “Eu amo a visão de Jeff para o espaço”, disse Lapsa em entrevista ao site Ars Technica. “Trabalhei em estreita colaboração com ele por um tempo em diferentes projetos e estou basicamente 100% a bordo com a visão. Além disso, acho que diria que deixarei a história de execução deles falar por si mesma e pensei que poderíamos nos mover mais rápido”.
Esta pode ser uma maneira educada de dizer que mais de duas décadas depois que Bezos fundou a Blue Origin, a empresa ainda não alcançou a órbita — seus voos são classificados como suborbitais. “Enquanto no voo orbital, a nave consegue circular a Terra, ou seja, partir e retornar à atmosfera a partir de um mesmo ponto, o voo suborbital não tem velocidade para completar essa trajetória, então a nave sobe até um ponto máximo e depois cai de volta à Terra”, afirmou o astrofísico do Centro Universitário FEI, Cássio Barbosa, em entrevista ao G1.
Assim, três anos atrás, Lapsa e seu colega Tom Feldman, também cientista de foguetes, começaram a procurar um lugar para fazer a diferença mais rápido, motivados por um desejo de iniciar a era do baixo custo, acesso regular ao espaço e ao futuro que poderia desbloquear para a humanidade.
Os engenheiros de propulsão analisaram a indústria dos EUA, que consistia em dezenas de empresas de foguetes. Depois de verificar alguns possíveis cenários favoráveis, finalmente, eles consideraram a SpaceX.
Lapsa disse que ele e Feldman estavam procurando três ingredientes-chave em uma empresa: foguetes rápidos e reutilizáveis, a equipe de engenharia certa e uma história de “execução habitual”.
A SpaceX preenchia praticamente todos os requisitos, já que o foco principal da empresa era o revolucionário e reutilizável foguete Starship. Além disso, mantinha “a maior e mais talentosa equipe de engenheiros de foguetes do mundo”, e nenhuma outra empresa voava mais que ela.
No entanto, ainda assim, Lapsa achou que não era o mais adequado. “Eles, sem dúvida, têm uma incrível história de execução, de coisas inspiradoras que transformaram absolutamente nossa indústria”, disse o engenheiro aeroespacial. “Mas, eu acho que há espaço para um estilo diferente de empresa. Falamos muito com pessoas que saem da SpaceX depois de três, cinco, dez ou 15 anos. Eles estão exaustos”.
Nascia a Stoke Space
Então, no final de 2019, Lapsa e Feldman não encontraram outra opção senão fundar sua própria empresa, a Stoke Space, movidos por uma forte convicção de que o futuro que eles queriam não estava acontecendo — mas estava ao alcance. “Demos um salto de fé e pulamos de um penhasco”, disse Lapsa.
A maioria das empresas de foguetes primeiro constrói um pequeno foguete dispensável como um meio de aprender a chegar ao espaço. No entanto, a Stoke Space começou com o objetivo de construir um foguete totalmente reutilizável desde o primeiro dia — não importando se outra empresa privada ou agência governamental tivesse feito o mesmo ou não.
Primeiro, eles tiveram que criar um projeto que fosse executável, ou seja, “que não exigia novas descobertas científicas”. Eles também queriam um veículo que pudesse ser recuperado o mais rápido possível, para estar pronto para voar novamente já no dia seguinte.
Esses requisitos de alto nível impulsionaram as decisões de design da Stoke. O foguete teria que ser robusto e capaz de tolerar uma possível falha sem ser perdido, tudo isso sem exigir inspeções detalhadas ou reformas significativas entre os lançamentos.
A SpaceX já havia mostrado o caminho no lançamento e recuperação de primeiro estágio com o Falcon 9 e sua decolagem e pouso verticais, então o pessoal da Stoke optou por fazer isso com o segundo estágio. “A indústria realmente não sabe como é um segundo estágio reutilizável ainda”, disse Lapsa.
Enquanto a pequena equipe trabalhava na engenharia, Lapsa também começou a aprender noções de arrecadação de fundos financeiros. Como viu a indústria espacial comercial atrair bilhões de dólares em capital de risco e, posteriormente, investimento público através de Empresas de Aquisição de Propósitos Especiais, ele achou que não seria tão difícil levantar dinheiro para um conceito inovador de lançamento. Mas… ele estava errado.
“A maior surpresa para mim é que é muito, muito difícil levantar dinheiro”, disse Lapsa. “Você vê um monte de manchetes como XYZ levanta um zilhão de dólares, e eu estava tipo ‘OK, quão difícil isso pode ser?’. Bem, é muito difícil. Você tem que ter um nível muito alto de convicção no que está fazendo para navegar mentalmente nesse caminho”.
Até o fim de 2020, a empresa fechou uma rodada de financiamento inicial de US$9 milhões (aproximadamente R$46 milhões), que permitiria um crescimento modesto no ano seguinte.
Com esse financiamento e um projeto de engenharia em mãos, a empresa acelerou o desenvolvimento. Nos 20 meses que se seguiram desde sua rodada inicial de financiamento, a Stoke construiu um motor de segundo estágio, um protótipo para o segundo estágio, turbobombas e instalações de fabricação. Também aumentou seu número de funcionários para 72 pessoas e finalizou o projeto geral do foguete, que tem uma capacidade de elevação de 1,65 toneladas para órbita baixa da Terra, em modo totalmente reutilizável.
Estrutura de aparência estranha simula segundo estágio do futuro foguete em teste
No mês passado, a empresa começou a testar seus motores de estágio superior. O vídeo publicado no Twitter mostra um anel de aparência intrigante com 15 propulsores discretos disparando por vários segundos.
Segundo a Stoke, a estrutura circular tem três metros de diâmetro, e seu design é a resposta da empresa para um dos maiores desafios de obter um segundo estágio de volta da órbita.
Normalmente, um foguete tradicional tem um estágio superior com um único motor, que tem um bico maior — muitas vezes em forma de sino — para otimizar o fluxo de escape do motor em um vácuo.
Como todas as partes de um foguete são projetadas para serem o mais leves possível, esses bicos estendidos são muitas vezes bastante frágeis porque eles só são expostos acima da atmosfera da Terra. Então, um problema em recuperar o estágio superior, especialmente se você quiser usar o motor para controlar e retardar sua descida, é proteger esse grande bico.
Uma forma de fazer isso é enterrar o bico do motor em um grande escudo térmico, o que exigiria demais da estrutura e da massa, podendo não ser dinamicamente estável. A solução encontrada pela Stoke foi usar um anel de 30 propulsores menores.
No vácuo, as plumas desses bicos são projetadas para se fundir e agir como uma só. E durante a reentrada, com um número menor de propulsores menores disparando, é mais fácil proteger os bicos.
Outro problema significativo no segundo estágio é proteger todo o veículo da atmosfera superaquecida durante a reentrada. Os ônibus espaciais da NASA conseguiam isso com telhas térmicas frágeis, mas essas peças exigiam 30 mil horas de dedicação dos funcionários para inspeção, testes e reforma entre os voos.
Lapsa pensou que fazia mais sentido tentar um escudo térmico regenerativo. A camada externa metálica dúctil do veículo será forrada com pequenas cavidades para fluir propelente através do material para mantê-lo frio durante a reentrada. O segundo estágio, portanto, pode retornar à Terra um pouco como uma cápsula espacial — base primeiro, com o escudo térmico resfriado regenerativamente.
Stoke Space tem um longo caminho pela frente para chegar ao espaço. Os testes do motor são um passo importante, mas apenas o primeiro da longa jornada. Em seguida, virão os testes de “salto” com uma versão em larga escala do segundo estágio. Esse protótipo não terá uma carenagem como seria durante o lançamento, mas ainda assim terá mais de 5,5 m de altura.
Inicialmente, os testes serão de baixa altitude, provavelmente atingindo algumas centenas de metros. “Se houver uma necessidade de engenharia para ir mais alto, a empresa vai considerar”, disse Lapsa. “Mas, por enquanto, o objetivo é provar a capacidade de controlar o foguete durante a subida e descida e fazer um pouso suave”.
Esse é um problema de orientação, navegação e controle bem importante, especialmente com um novo sistema de propulsores distribuídos. “Este é uma espécie de ponto de prova final desta arquitetura”, disse Lapsa. “É novo. É diferente. É estranho, não é? É original. Havia um monte de perguntas que tínhamos sobre como essa coisa vai funcionar. Mas já mitigamos muito risco”.
Se a Stoke conseguir pousar o estágio superior, a empresa pode avançar com o primeiro estágio e começar a transformar o foguete ainda sem nome em um veículo orbital.
É justo dizer que Lapsa e Feldman ainda estão caindo depois de pular do penhasco há três anos. Ainda falta um tempo para descobrirmos se sua empresa e seu foguete proposto terão um pouso suave.
Fonte: Olhar Digital
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