Localizada no norte do Turcomenistão, na Ásia Central, a Cratera de Darvaza, de 69 metros de largura e 30 metros de profundidade, é curiosamente conhecida como “Porta do Inferno”. Isso porque do seu interior emanam chamas que vêm queimando continuamente há 52 anos, alimentada pelos ricos depósitos de gás natural da área.

Quando pude ver pela primeira vez e caminhar até a borda, e o vento desértico e quente vindo da cratera me atingiu no rosto, senti que aquele era o tipo de lugar de onde poderia sair o próprio Satanás, com tridente e tudo

George Kourounis, explorador greco-canadense especializado em documentar climas extremos e desastres naturais em todo o mundo, em entrevista à BBC

Em uma expedição realizada no local em 2013 para o canal de TV National Geographic, Kourounis tentou descobrir como esse “fogo eterno” se originou.

Segundo a teoria mais difundida, em 1971, geólogos soviéticos estavam perfurando o deserto de Karakum com o objetivo de encontrar petróleo, quando se depararam com uma reserva de gás natural que fez com que a terra desmoronasse, formando três grandes sumidouros.

Para evitar que o metano fosse liberado na atmosfera, eles atearam fogo em um dos sumidouros, pensando que iria queimar em questão de semanas – o que acabou se estendendo “eternamente”.

Kourounis diz, no entanto, que não há documentos para respaldar essa versão.

Cratera de Darvaza, de 69 metros de largura e 30 metros de profundidade, curiosamente conhecida como “Porta do Inferno”, localizada no Turcomenistão, antigo território soviético. Imagem: Matyas Rehak – Shutterstock

Então, como surgiu a Porta do Inferno?

Após sua primeira expedição à região, o explorador descobriu que ninguém sabia realmente a origem da cratera. “Uma das coisas mais impressionantes e frustrantes sobre esta cratera é que realmente não há muita informação sobre ela. Você não consegue obter nem sequer visitando o país”.

Ele conta ter feito “todo o possível” para encontrar algum relatório ou registro oficial, ou mesmo algum jornal que mencionasse o incidente. “Mas, nada”.

Uma versão diferente da teoria mais propagada diz que a enorme cratera teria se formado na década de 1960 e começado a queimar cerca de 20 anos mais tarde. “Há inclusive controvérsia sobre se ela foi incendiada acidentalmente, como pela queda de um raio, ou se foi intencional”, diz Kourounis.

Outra linha sugere que pode ter sido aplicada a técnica de “flaring“, comum na extração de gás natural, em que os excedentes são queimados intencionalmente por economia e segurança – algo semelhante ao procedimento adotado por refinarias de petróleo, como ocorrido no último fim de semana em Cubatão, litoral sul de São Paulo.

No entanto, especialistas acreditam que se tivesse sido esse o caso, como a energia era uma questão estratégica para os soviéticos, os relatórios ou registros a esse respeito teriam sido classificados como ultrassecretos.

Para o historiador Jeronim Perović, professor de História da Europa Oriental na Universidade de Zurique, Suíça, essa falta de consistência de dados sobre a “Porta do Inferno” faz sentido. 

“É um reflexo de como as coisas funcionavam nos tempos soviéticos”, diz ele. “Naquela época, só se relatavam os sucessos, não os fracassos. Portanto, se a população local fizesse algo errado, ninguém queria que essa informação vazasse”.

Embora seja um ambiente hostil, a Cratera de Darvaza atrai muitos interessados em turismo de aventura. Imagem: AlexelA – Shutterstock

Segundo Perović, como a União Soviética (URSS) não tinha problemas de abastecimento de gás, já que produzia cerca de 700 bilhões de metros cúbicos por ano, é provável que queimá-lo tenha sido a alternativa mais prática.

Stefan Green, microbiólogo que participou da expedição de Kourounis, ressalta, no entanto, que “liberar metano de maneira descontrolada é uma ideia muito ruim”, por isso há uma certa lógica em queimá-lo. “É extremamente perigoso, se estiver queimando constantemente, não se acumula em uma determinada área. Do contrário, você terá uma grande explosão”.

Seja como for, o fogo perdura há anos. “Infelizmente, é um problema que não foi resolvido até hoje”, diz Perovic.

Por que não apagam o fogo da cratera?

O Turcomenistão já chegou a considerar apagar o fogo da “Porta do Inferno”. No entanto, as autoridades decidiram que mantê-la acesa seria uma boa forma de promover o turismo local.

O poço de fogo que “arrota” metano se tornou uma das atrações turísticas mais populares em um país que recebe apenas cerca de 6 mil visitantes por ano. O brilho noturno da cratera fascina os aventureiros que adentram as áreas inóspitas do deserto de Karakum, de difícil acesso.

Kourounis descreve como essa experiência para ele foi incrível. “Ficar no fundo da cratera com uma roupa de proteção, com a qual você parece um astronauta, cercado pelo que chamo de ‘coliseu de fogo’, é uma das experiências mais próximas de visitar outro mundo aqui na Terra que qualquer um pode ter”.