Uma ferramenta de IA (inteligência artificial) identificou pessoas com maior risco de câncer de pâncreas. E sua previsão, que levou em consideração apenas os registros médicos dos pacientes, veio até três anos antes do diagnóstico. É o que revelou uma nova pesquisa, liderada por cientistas da Faculdade de Medicina de Harvard (EUA) e da Universidade de Copenhague (Dinamarca).
As descobertas, publicadas na revista científica Nature Medicine, sugerem que triagem populacional baseada em IA pode ser valiosa para encontrar pessoas com risco elevado para a doença. Isso pode acelerar diagnóstico de uma condição encontrada com muita frequência em estágios avançados, quando o tratamento é menos eficaz e resultados são sombrios, segundo os pesquisadores. O câncer de pâncreas é um dos mais mortais do mundo – e seu número deve aumentar.
IA com potencial inovador
Atualmente, não existem ferramentas capazes de rastrear amplamente o câncer de pâncreas numa população. Assim, aqueles com histórico familiar e certas mutações genéticas que os predispõem ao câncer de pâncreas são rastreados de maneira direcionada. Mas essas triagens direcionadas podem perder outros casos que não se enquadram nessas categorias, explicaram os pesquisadores.
Uma ferramenta de IA que pode se concentrar naqueles com maior risco de câncer pancreático, que mais se beneficiam de mais testes, pode ajudar muito a melhorar a tomada de decisões clínicas.
Chris Sander, professor da faculdade de medicina de Harvard e coautor do estudo
Aplicada em grande escala, acrescentou Sander, essa abordagem pode agilizar a detecção do câncer pancreático, levar a um tratamento mais precoce, melhorar os resultados e prolongar a expectativa de vida dos pacientes.
“Muitos tipos de câncer, especialmente aqueles difíceis de identificar e tratar precocemente, exercem um impacto desproporcional sobre pacientes, famílias e o sistema de saúde como um todo”, explicou Søren Brunak, professor na Universidade de Copenhague e coautor da pesquisa. “A triagem baseada em IA é uma oportunidade para alterar a trajetória do câncer de pâncreas, uma doença agressiva que é notoriamente difícil de diagnosticar precocemente e tratar prontamente quando as chances de sucesso são maiores”, acrescentou.
Como cientistas realizaram estudo
Algoritmo foi treinado em dois conjuntos de dados separados, totalizando nove milhões de registros de pacientes da Dinamarca e dos Estados Unidos. Depois, pesquisadores “pediram” ao modelo de IA que procurasse sinais indicadores com base nos dados contidos nos registros.
Com base em combinações de códigos de doenças e no momento de sua ocorrência, modelo conseguiu prever quais pacientes provavelmente desenvolveriam câncer pancreático no futuro. Aliás, muitos dos sintomas e códigos de doenças não estavam diretamente relacionados – nem eram derivados – do pâncreas.
Em seguida, cientistas testaram diferentes versões dos modelos de IA quanto à capacidade de detectar pessoas com risco elevado de desenvolvimento de doenças em diferentes escalas de tempo – seis meses, um ano, dois anos e três anos.
No geral, cada versão do algoritmo de IA foi substancialmente mais precisa na previsão de quem desenvolveria câncer de pâncreas do que estimativas atuais de incidência da doença em nas populações estudadas.
Pesquisadores disseram acreditar que modelo é ao menos tão preciso na previsão da ocorrência de doenças quanto testes atuais de sequenciamento genético. Esses geralmente estão disponíveis apenas para um pequeno subconjunto de pacientes em conjuntos de dados.
Vantagens
A triagem para certos tipos de câncer comuns, como os de mama, colo do útero e próstata, depende de técnicas relativamente simples e altamente eficazes – mamografia, exame de Papanicolaou e exame de sangue, respectivamente. Esses métodos de triagem transformaram os resultados dessas doenças, garantindo a detecção precoce e a intervenção durante estágios mais tratáveis.
Já em relação ao câncer de pâncreas, é mais difícil e caro de rastrear e testar. Os médicos analisam principalmente o histórico familiar e a presença de mutações genéticas – embora sejam indicadores importantes de risco futuro, muitas vezes acabam passando.
Uma vantagem particular da ferramenta de IA é que ela pode ser usada em todo e qualquer paciente para o qual os registros de saúde e histórico médico estejam disponíveis, não apenas naqueles com histórico familiar conhecido ou predisposição genética para a doença. Isso é especialmente importante, acrescentam os pesquisadores, porque muitos pacientes de alto risco podem nem estar cientes de sua predisposição genética ou histórico familiar.
Na ausência de sintomas e sem indicação clara de que alguém tem alto risco de câncer de pâncreas, médicos podem ser compreensivelmente cautelosos ao recomendar testes mais sofisticados e mais caros, como tomografia computadorizada, ressonância magnética ou ultrassonografia endoscópica. Quando esses testes são usados e as lesões suspeitas são descobertas, o paciente deve passar por um procedimento para obter biópsia.
O ‘órgão irritado’
Posicionado no fundo do abdome, o pâncreas é um órgão de difícil acesso que inflama facilmente. Por conta dessa irritabilidade, com o tempo ganhou apelido de “órgão irritado”.
Então, uma ferramenta de IA que identifica aqueles com maior risco de câncer de pâncreas garantiria que médicos testassem população com mais assertividade. Isso pouparia outros testes desnecessários e procedimentos adicionais, disseram os pesquisadores.
Cerca de 44% das pessoas diagnosticadas nos estágios iniciais do câncer de pâncreas sobrevivem cinco anos após o diagnóstico, mas apenas 12% dos casos são diagnosticados tão cedo. A taxa de sobrevivência cai para 2 a 9% naqueles cujos tumores cresceram além de seu local de origem, estimam os pesquisadores.
Essa baixa taxa de sobrevivência ocorre apesar dos avanços marcantes nas técnicas cirúrgicas, quimioterapia e imunoterapia. Portanto, além de tratamentos sofisticados, há uma clara necessidade de melhor triagem, testes mais direcionados e diagnóstico precoce. É aqui que a abordagem baseada em IA entra como o primeiro passo crítico nesse continuum.
Chris Sander, professor da faculdade de medicina de Harvard e coautor do estudo
Com informações de Harvard Medical School
Fonte: Olhar Digital
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