Por mais de 50 anos, projetistas de processadores – também chamados de chips – usaram uma tática para aumentar desempenho: encolher componentes eletrônicos para colocar mais energia nos pedaços de silício. Porém, engenheiros da AMD sugerem ideia radical que pode ser resposta para os EUA continuarem na vanguarda dessa tecnologia.
É assim: em vez de projetar microprocessador com grande número de transistores minúsculos, eles criaram um a partir de chips menores, que seriam empacotados juntos para funcionar como um cérebro eletrônico.
Chiplets
O conceito, chamado de chiplets em inglês, pegou em grande escala, com AMD, Apple, Amazon, Tesla, IBM e Intel apresentando tais produtos. Eles ganharam força rapidamente porque chips menores são mais baratos de fabricar, enquanto pacotes deles podem superar desempenho de qualquer fatia de silício.
A estratégia, baseada em tecnologia de embalagem avançada, desde então se tornou ferramenta essencial para progresso em semicondutores. E representa uma das maiores mudanças em anos para uma indústria que impulsiona inovações em áreas como IA (inteligência artificial), carros autônomos e equipamentos militares.
“A embalagem é onde a ação vai acontecer”, disse Subramanian Iyer, professor de engenharia elétrica e de computação da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, que ajudou a criar o conceito de chiplet. “Está acontecendo porque na verdade não há outra maneira”, acrescentou.
O problema é que esse tipo de embalagem, assim como a própria fabricação de chips, é predominantemente dominada por empresas da Ásia. Embora os EUA representem cerca de 12% da produção global de semicondutores, empresas estadunidenses fornecem apenas 3% da embalagem de chips, de acordo com a associação comercial IPC.
Política industrial dos EUA
Essa questão colocou “chipzinhos” no meio da formulação de políticas industriais dos EUA. A Lei CHIPS – pacote de subsídios de US$ 52 bilhões (aproximadamente R$ 260 bilhões, na cotação atual) aprovado em 2022 – foi vista como uma medida do presidente dos EUA, Joe Biden, para revigorar fabricação doméstica de processadores.
Isso porque esse pacote vai fornecer dinheiro para construir fábricas mais sofisticadas. Mas parte disso também visava alimentar fábricas avançadas de embalagens país, para capturar mais desse processo essencial.
À medida que chips ficam menores, maneira como você organiza chips, que é a embalagem, é cada vez mais importante. E precisamos que isso seja feito nos EUA.
Gina Raimondo, secretária de Comércio dos EUA, em discurso na Universidade de Georgetown, em fevereiro de 2023
O Departamento de Comércio atualmente aceita pedidos de subsídios de fabricação via Lei CHIPS. Inclusive, para fábricas de embalagens de chips. Também aloca fundos para programa de pesquisa especificamente sobre embalagens avançadas.
Algumas empresas de embalagens de chips correm para conseguir financiamento. Uma delas é a Integra Technologies, em Wichita, no Kansas. Companhia anunciou planos para expansão de US$ 1,8 bilhão (R$ 9 bilhões). Mas disse que isso dependia do recebimento de subsídios federais.
A Amkor Technology, serviço de embalagens do Arizona que tem a maior parte de suas operações na Ásia, também disse que conversava com clientes e funcionários do governo sobre produção nos EUA.
Como chiplets são feitos
Empacotar chips juntos não é um conceito novo. Os chiplets são apenas a iteração mais recente dessa ideia. Ela usa avanços tecnológicos que ajudam a amontoar os chips – lado a lado ou empilhados uns sobre os outros – junto a conexões elétricas mais rápidas entre eles.
O que há de único nos chiplets é a maneira como eles são conectados eletricamente.
Richard Otte, CEO da Promex Industries, serviço de empacotamento de chips em Santa Clara, na Califórnia
Processadores não podem fazer nada sem uma maneira de conectá-los a outros componentes. Isso significa que precisam ser colocados em algum tipo de pacote capaz de transportar sinais elétricos.
Esse processo começa depois que as fábricas concluem a fase inicial de fabricação, capaz de criar centenas de chips numa espécie de wafer de silício. Depois que o wafer é cortado, chips individuais são normalmente ligados a uma camada chamada substrato, condutora de sinais elétricos.
Combinação é, então, revestida em plástico protetor, formando pacote que pode ser conectado a uma placa de circuito – essencial para conexão com outros componentes de um sistema.
Trajetória dos processadores
Esses processos originalmente exigiam muito trabalho manual, levando empresas do Vale do Silício a transferir embalagens para países com salários mais baixos na Ásia há mais de 50 anos. Maioria dos chips normalmente é enviada para serviços de embalagem em países como Taiwan, Malásia, Coreia do Sul e China.
Desde então, avanços nas embalagens ganharam importância, devido aos retornos decrescentes da Lei de Moore – expressão abreviada para miniaturização de chips que, por décadas, impulsionou progresso no Vale do Silício. Seu nome vem de Gordon Moore, cofundador da Intel, cujo artigo de 1965 descrevia a rapidez com que empresas dobraram número de transistores num processador típico, o que melhorou desempenho a um custo menor.
Porém, hoje em dia, transistores menores não são necessariamente mais baratos. Em parte, porque construção de fábricas para chips de ponta pode custar de US$ 10 bilhões (R$ 50 bilhões) a US$ 20 bilhões (R$ 100 bihões).
Processadores grandes e complexos também são caros para projetar e tendem a ter mais defeitos de fabricação. Mesmo quando empresas em áreas como IA generativa (tecnologia do ChatGPT, por exemplo) querem mais transistores do que atualmente podem ser colocados nos maiores chips que máquinas de fabricação permitem.
A resposta natural a isso é colocar mais coisas num pacote.
Anirudh Devgan, CEO da Cadence Design Systems
Software da empresa de Devgan é usado para projetar tanto processadores convencionais quanto produtos do tipo chiplet.
A rival Synopsys disse que rastreava mais de 140 projetos de clientes com base no empacotamento de vários processadores. Até 80% dos microprocessadores usarão designs no estilo chiplet até 2027, de acordo com a empresa de pesquisa de mercado Yole Group.
Situação atual
Hoje em dia, empresas geralmente projetam os “chipzinhos” num pacote junto a sua própria tecnologia de conexão. Mas grupos da indústria trabalham em padrões técnicos para que empresas possam montar produtos com mais facilidade a partir de chiplets de diferentes fabricantes.
Nova tecnologia é usada principalmente agora para desempenho extremo. A Intel lançou recentemente um processador chamado Ponte Vecchio, com 47 chiplets que será usado num poderoso supercomputador no Argonne National Laboratory, que fica perto de Chicago.
Em janeiro, AMD divulgou planos para um produto incomum: o MI300. Ele combina chips para cálculos padrão com outros projetados para gráficos, juntamente a um conjunto grande de chips de memória.
Esse processador, destinado a alimentar outro supercomputador avançado no Lawrence Livermore National Laboratory, tem 146 bilhões de transistores, em comparação com dezenas de bilhões dos chips convencionais mais avançados.
Retorno financeiro dos chiplets
Chiplets valeram a pena para a AMD. Empresa vendeu mais de 12 milhões de chips com base na ideia desde 2017, de acordo com a Mercury Research. E se tornou um player importante em microprocessadores que alimentam a web.
Serviços de embalagem ainda precisam de outros para fornecer substratos que os processadores precisam para se conectar às placas de circuito e uns aos outros. Uma empresa que tem impulsionado o boom dos chiplets é a Taiwan Semiconductor Manufacturing Company. Companhia já fabrica chips para a AMD e centenas de outras, além de fornecer substrato avançado à base de silício, chamado interposer.
A Intel desenvolve tecnologia semelhante, bem como aprimora substratos plásticos convencionais mais baratos numa abordagem preferida por alguns. Entre eles, está Eliyan, startup do Vale do Silício. Intel também trabalha em novos protótipos de embalagens sob um programa do Pentágono. E espera obter o apoio da Lei CHIPs para nova fábrica de embalagens.
Questão dos substratos
Os EUA não têm grandes fabricantes desses substratos, produzidos principalmente na Ásia e evoluídos a partir de tecnologias usadas na fabricação de placas de circuito. Muitas empresas dos Estados Unidos também deixaram esse negócio, outra preocupação que grupos da indústria esperam estimular financiamento federal. Isso ajudaria fornecedores de placas a começarem a fabricar substratos.
Em março, Biden determinou que embalagens avançadas e produção de placas de circuito doméstico eram essenciais para a segurança nacional. Presidente também anunciou US$ 50 milhões (R$ 250 milhões) em financiamento da Lei de Produção de Defesa para empresas estadunidenses e canadenses nessas áreas.
Mesmo com esses subsídios, reunir os elementos necessários para reduzir dependência dos EUA das empresas asiáticas “é um grande desafio”, disse Andreas Olofsson, que dirigiu pesquisa do Departamento de Defesa no campo antes de fundar uma startup de embalagens chamada Zero ASIC.
Você não tem fornecedores. Você não tem força de trabalho. Você não tem equipamento. Você tem que começar do zero.
Andreas Olofsson
Com informações de The New York Times
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Fonte: Olhar Digital
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