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Problemas enfrentados por Buenos Aires podem afetar os planos de reindustrialização do governo Lula; eleições presidenciais deste ano no país vizinho tendem a ser uma prévia do que deve acontecer por aqui em 2026
A Argentina é o terceiro maior parceiro comercial do Brasil, o que faz com que movimentações no território argentino tenham repercussão em solo brasileiro. A atenção ao país vizinho se torna ainda mais necessária em ano de eleições presidenciais, como é o caso dos “hermanos”. Buenos Aires tem mostrado sinais de cansaço dos partidos tradicionais e do peronismo, dando indícios de caminhar rumo à direita conservadora. Além da questão política, uma crise na Argentina poderia afetar a indústria brasileira e prejudicar os planos de reindustrialização do país. Como resultado, toda a América Latina seria impactada. Do ponto de vista econômico, os especialistas pontuam que a situação do Brasil não se assemelha à crise vivenciada pela Argentina. Porém, Brasília deveria aprender com as dificuldades que os vizinhos tem enfrentado para não passar por situações iguais ou até mesmo mais complicadas. Já no setor político, os países vivem cenários similares, e as eleições de 2023 da Argentina podem ser uma prévia do que o Brasil deve enfrentar daqui a três anos, quando precisar voltar às urnas para escolher o próximo chefe de Estado.
Consultor econômico e analista internacional, Gustavo Segré pondera que é importante mencionar que a crise argentina é crônica. Ele relembra que o país alterou a moeda nacional cinco vezes desde 1881 e possui uma dívida “caloteira”, pois os débitos não são pagos. “Além disso, a Argentina tem um problema muito sério com déficit fiscal. Historicamente, ela não se preocupa com isso e gasta mais do que arrecada. Desde 1900 até hoje, ou seja 123 anos, somente em dez anos o país registrou superávit. Isso mostra que um descuido crônico com as contas públicas, que termina refletindo em uma crise da qual é muito difícil sair”, observa. Segré destaca que os indicadores econômicos são muito diferentes entre os dois países, mas que o cenário argentino deve ensinar ao Brasil a importância de controlar os gastos públicos.
A avaliação de Livio Ribeiro, pesquisador associado do FGV-IBRE, é que as similaridades entre os países são baixíssimas do ponto de vista econômico. “A Argentina não é relevante para basicamente nenhum lugar do mundo, com exceção do Brasil. O que a gente precisa tomar muito cuidado é que a Argentina ainda é um parceiro comercial relevante para nós, apesar de menos do que foi no passado. E também é um país que está permanentemente em crise. A Argentina em crise nos atrapalha, mas tentar salvá-la das suas próprias agruras também não é o nosso trabalho”, opina. Vinicius Vieira, professor de relações internacionais da Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), avalia que a situação do Brasil está muito longe da enfrentada por Bueno Aires. Contudo, é necessário que os agentes brasileiros fiquem de olho no país vizinho porque ele é o principal mercado via Mercosul para produtos manufaturados. “Uma crise na Argentina poderia ser fatal para nossa indústria e, portanto, para os nossos planos de reindustrialização”, avalia.
Professora de relações internacionais da FESPSP e pesquisadora do Observatório de Regionalismo (ODR), Flavia Ross acrescenta que o Brasil conseguiu evitar os erros cometidos pelos sucessivos governos argentinos desde a década de 1990, como a dolarização da economia. Contudo, no que diz respeito à política, a situação dos dois países é parecida. “A polarização da sociedade brasileira continua, e o governo Lula tem encontrado dificuldades no Congresso para a aprovação de medidas que julga necessárias. Na Argentina, a polarização entre dois campos políticos na sociedade é conhecida como ‘La Grieta’ e está refletida na queda de popularidade de Fernández, além de se apresentar como um componente importante das campanhas presidenciais deste ano. O Brasil deve observar com atenção os próximos movimentos da política argentina, não apenas por conta dos laços comerciais que nos unem e pelo futuro do Mercosul, mas também porque as eleições argentinas de 2023 podem mostrar uma tendência para o que enfrentaremos em termos de polarização nas nossas eleições de 2026”, avalia.
Os argentinos estão cansados do peronismo e dos partidos tradicionais. Portanto, não surpreende o fato de Javier Milei, admirador de Jair Bolsonaro e de Donald Trump, estar recebendo um forte impulso popular. O historiador José Luiz Beired, professor da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), adianta que a “Argentina está se transformando em um país bipartidário, porque existe um descontentamento com suas grandes forças, e uma terceira tem surgido”. O especialista fala que é exatamente isso que faz com que Milei esteja ganhando espaço: ele tem um discurso atrativo, promete ser moderno, consegue atrair os jovens e traz soluções radicais para os problemas econômicos do país. “Existem uma grande dúvida da viabilidade das ideias de Milei e os riscos que pode vir a apresentar para o país. Se ele ganhar, há chance de reviver a terrível crise de 2001.”
A vitória de um governante de direita na Argentina pode afetar os laços com o Brasil, que atualmente tem um presidente de esquerda. “A relação Brasil e Argentina passa pelas relações políticas dos partidos que estão no poder. Quando tínhamos Mauricio Macri no poder, ele dialogava com Jair Bolsonaro. Quando Alberto Fernández venceu, as relações enfraqueceram, mas voltaram a se fortalecer com Luiz Inácio Lula da Silva no poder”, explica o coordenador de pós-graduação em relações institucionais e governamentais do Mackenzie, Márcio Coimbra. Ou seja, existe o risco de estremecer as relações porque, nos anos recentes, a união entre os países “está baseada em aliança partidárias políticas e não de Estado. “O que é um grande erro, até porque os países tem que ter uma relação que perpasse as diferenças políticas para que assim possam ter um avanço econômico, político e social”.
Fonte: Jovem Pan News
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