Nos últimos dias, rumores de que cientistas da NASA teriam emitido alertas sobre um possível “apocalipse da internet” esperado para a próxima década causaram um verdadeiro alvoroço nas redes sociais ao redor do mundo. Postagens no Instagram, Facebook, Twitter, TikTok e outras plataformas trataram o tema com o devido alarde que já sabemos ser bem comum nesses veículos.
Mas, o que esse burburinho tem de verdade e o que não passa de exagero da web? Venha entender tudo isso.
“Apocalipse da internet” virou notícia há dois anos
Uma reportagem publicada pelo jornal britânico Mirror no início do mês foi o estopim para essa onda de postagens alarmistas acerca de um apagão da internet no mundo, que seria causado pelo Sol.
No entanto, vale lembrar que esse assunto não é de hoje. Tudo começou, na verdade, em 2021, com a publicação de um estudo conduzido por uma pesquisadora da Universidade da Califórnia chamada Sangeetha Abdu Jyothi, que previa um cenário semi apocalíptico, no qual cabos submarinos de fibra óptica estariam especialmente vulneráveis a um evento de ejeção de massa coronal de grande porte – ou seja, uma supertempestade solar. (O Olhar Digital falou sobre essa pesquisa aqui).
Segundo a cientista, se um fluxo de vento solar extremo voltado para a Terra atingisse o planeta, afetaria esses cabos internacionais de internet, cortando o fornecimento de conexão na fonte. “É como fechar o suprimento de água de uma casa quebrando o encanamento da rua”, exemplificou Sangeetha.
Quase dois anos depois, o assunto volta à tona – algo que costuma acontecer bastante, a propósito. No fim do ano passado, por exemplo, a internet “ressuscitou” uma história de 2017 que dizia que a NASA vai mandar apenas mulheres para Marte para “evitar sexo no espaço”.
Supertempestade solar já interrompeu sistemas de comunicação na Terra
O medo generalizado do tal “apocalipse da internet” provocou uma avalanche de desinformação de rápida disseminação sobre avisos inexistentes da NASA e especulações sobre o que seria da humanidade um mundo offline.
Conforme destaca o jornal The Washington Post (TWP), é fácil entender o porquê de tanta polêmica. Afinal, praticamente todos os aspectos da vida humana estão ligados à internet, e sua ausência pode ter consequências desastrosas – sem mencionar que muita gente mal aguenta uma viagem de elevador de 30 segundos sem Wi-Fi.
Especialistas apontam que uma interrupção generalizada da internet pode, de fato, ser provocada por uma forte tempestade solar que vier a atingir a Terra – um evento raro, mas muito real, que ainda não aconteceu na era digital.
O Sol tem um ciclo de 11 anos de atividade solar, e está atualmente no que os astrônomos chamam de Ciclo Solar 25. Esse número se refere aos ciclos que foram acompanhados de perto pelos cientistas.
Arrebentações na superfície solar causadas por emaranhados nos campos magnéticos da estrela enviam partículas carregadas de radiação à incrível velocidade de 1,6 milhão de km/h, podendo atingir até mais nos casos de sinalizadores de maior classificação.
As erupções solares às vezes são acompanhadas por ejeções de massa coronal (CMEs), que são nuvens de plasma magnetizado que podem levar até três dias para chegar à Terra.
Dependendo da potência com que chegam por aqui, as CMEs desencadeiam tempestades geomagnéticas na atmosfera de maior e menor proporção. Essas tempestades geram belas exibições de auroras, mas também podem causar apagões de energia e até mesmo derrubar satélites da órbita.
Quando uma tempestade solar que ficou conhecida como “Evento Carrington” atingiu o planeta em 1859, as linhas telegráficas foram afetadas, operadores foram eletrocutados e auroras boreais desceram para latitudes incrivelmente baixas.
Mais de um século depois, em 1989, uma tempestade solar interrompeu a rede elétrica de Quebec, no Canadá, por longas horas. E em 2012, um outro evento do tipo passou raspando pela Terra, o que evitou graves consequências.
NASA usa sonda espacial para investigar a atividade solar
Várias das postagens que espalham o (até então) boato sobre o apocalipse da internet citam que a Parker Solar Probe, uma sonda espacial desenvolvida pela NASA para orbitar o Sol, detectou que o evento estaria próximo de acontecer.
E isso não é verdade. A missão Parker tem por objetivo examinar o comportamento do astro e entender como ele consegue provocar efeitos espaciais climáticos capazes de afetar desde a segurança de astronautas durante caminhadas espaciais até o funcionamento de satélites e de redes de energia, além da ocorrência de auroras na atmosfera terrestre.
No entanto, em momento algum foi divulgado pela NASA que a espaçonave teria descoberto qualquer evento extremo em vias de acontecer nos próximos anos.
Na verdade, a sonda nem faz previsões. Ocorre que, desde que foi lançada, ela já fez alguns sobrevoos próximos à coroa solar para examinar a atividade da estrela e, com base nessas aproximações, bem como em levantamentos feitos por outros equipamentos (como o Observatório de Dinâmicas Solares, por exemplo), os cientistas da NASA conseguem projetar os períodos de maior e menor movimentação na estrela.
Espera-se que a sonda Parker faça mais 12 passagens próximas do Sol ao longo dos próximos dois anos da missão, prevista para ser concluída em meados de 2025.
O que pode ter dado forças à volta dos rumores sobre o apocalipse da internet é que, há algumas semanas, cientistas publicaram novas evidências da sonda sobre a origem dos ventos solares, que dizem ser resultado de um fenômeno chamado “reconexão magnética”.
Embora a pesquisa não tenha olhado especificamente para tempestades solares, ela tem relevância mais ampla. “A atmosfera solar muda muito lentamente”, diz Stuart Bale, professor de física da Universidade da Califórnia em Berkeley e pesquisador principal da sonda Parker na NASA. “Então, sempre que algo muda muito rápido magneticamente no Sol, provavelmente é devido à reconexão”.
Ele explica que os estudos servem justamente para reunir informações que possam ser úteis para prevenir cenários catastróficos. “Quanto mais soubermos sobre a reconexão magnética no Sol, mais poder preditivo isso nos dará para o clima espacial”.
Bale disse ao TWP que entende o tipo de pânico que a ideia de “apocalipse da internet” incute. Mas, normalmente, o cientista não se preocupa muito com isso. “De certa forma, prefiro cultivar minhas próprias batatas no campo, não usando um celular”, disse ele.
Ou seja: vamos seguir com as nossas vidas em paz, porque o apagão da internet, definitivamente, não é um assunto que mereça tanto a nossa atenção e preocupação – pelo menos por enquanto.
Fonte: Olhar Digital
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