Pesquisadores treinaram com sucesso um modelo de aprendizado de máquina – um tipo de IA (inteligência artificial) – a bordo de um satélite. É a primeira vez que isso é feito no espaço.

Para quem tem pressa:

Esse avanço pode aprimorar o monitoramento e a tomada de decisões em tempo real em diversos contextos – desde o gerenciamento de desastres até o combate ao desmatamento.

O projeto foi resumido numa publicação no servidor arXiv e apresentado na IGARSS (Conferência Internacional de Geociências e Sensoriamento Remoto) em julho de 2023.

Dados em satélites

Satélite Aeolus no espaço
(Imagem: ESA)

A coleta de dados por satélites de sensoriamento remoto é fundamental para diversas atividades importantes. Entre elas, estão: mapeamento aéreo, previsão do tempo e monitoramento de desmatamento.

No entanto, atualmente a maioria dos satélites apenas coleta dados passivamente, sem capacidade de tomar decisões ou detectar mudanças.

Assim, os dados precisam ser transmitidos para a Terra para serem processados, o que geralmente leva várias horas ou até dias. Isso limita a capacidade de identificar e responder a eventos emergentes rapidamente, como desastres naturais.

Treinamento de IA no espaço

Imagem de satélite no espaço
Satélite ION SCV004, no qual IA foi treinada (Imagem: Universidade de Oxford)

Para superar essas restrições, um grupo de pesquisadores decidiu treinar o primeiro programa de aprendizado de máquina no espaço. Quem liderou os trabalhou foi o estudante de doutorado Vít Růžička, do Departamento de Ciência da Computação da Universidade de Oxford.

Em 2022, eles conseguiram convencer a missão “Dashing through the Stars” (“Correndo pelas estrelas”, em tradução livre) a aceitar suas propostas de projeto a serem realizados a bordo do satélite ION SCV004, lançado em janeiro de 2022. Durante o outono de 2022, o código do programa foi enviado ao satélite, que já estava em órbita.

Os pesquisadores treinaram um modelo simples para detectar mudanças na cobertura de nuvens a partir de imagens aéreas diretamente dentro do satélite, ao invés de treiná-lo na Terra.

O modelo foi baseado numa abordagem chamada “few-shot learning” (“aprendizagem com poucas tentativas”, em tradução livre). Ele permite que o modelo aprenda as características mais importantes a serem procuradas com algumas amostras para treinamento.

Processo (muito) ágil

Chips, IA
Imagem: IM Imagery/Shutterstock)

Uma vantagem chave dessa abordagem é que os dados podem ser comprimidos em representações menores, tornando o modelo mais rápido e eficiente.

Durante a fase de treinamento, o modelo RaVAEn comprime arquivos de imagens grandes em vetores de 128 números. Ele aprende a manter apenas os valores informativos nesse vetor, relacionados à mudança que está tentando detectar – nesse caso, se há nuvens presentes ou não.

Isso resulta num treinamento extremamente rápido devido ao uso de um modelo de classificação muito pequeno para treinar.

A primeira parte do modelo, que comprime as novas imagens, foi treinada na Terra. Já a segunda parte, que decide se a imagem contém nuvens ou não, foi treinada diretamente no satélite.

Normalmente, desenvolver um modelo de aprendizado de máquina exigiria várias rodadas de treinamento usando o poder de um conjunto de computadores interligados.

No entanto, o modelo compacto da equipe concluiu a fase de treinamento (usando mais de 1,3 mil imagens) em cerca de um segundo e meio.

IA na prática

Montagem com capturas de tela de imagens analisadas pela IA
(Imagem: Universidade de Oxford)

Quando testado em dados novos, o modelo conseguiu detectar automaticamente se uma nuvem estava presente ou não em cerca de um décimo de segundo. Isso envolveu a codificação e análise de uma cena equivalente a quase 450 campos de futebol.

Segundo os pesquisadores, o modelo pode ser facilmente adaptado para realizar diferentes tarefas e usar outras formas de dados.

Com esse avanço, eles planejam desenvolver modelos mais avançados que possam diferenciar automaticamente entre mudanças de interesse. Por exemplo: inundações, incêndios, desmatamento e mudanças naturais (como alterações na cor das folhas ao longo das estações).

Além disso, eles têm como objetivo desenvolver modelos para dados mais complexos, incluindo imagens de satélites hiperespectrais.

Isso poderia permitir, por exemplo, a detecção de vazamentos de metano e teria implicações importantes no combate às mudanças climáticas.

Com informações da Universidade de Oxford

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