A Guatemala decide neste domingo, 20, quem será o novo presidente do país. Estão na disputa no segundo turno Sandra Torres, ex-esposa do falecido presidente social-democrata Álvaro Colom, e Bernardo Arévalo, que concorre à presidência pela primeira vez e foi a grande surpresa das eleições – as pesquisas não constavam que ele conseguisse passar do primeiro turno. Arévalo é filho do ex-presidente Juan José Arévalo (1945-1951), que deixou sua marca no país. A campanha eleitoral, que começou conturbada devido à exclusão de candidatos, perseguição a jornalistas e denúncias de distribuição de alimentos em troca de votos, ganhou um episódio a mais após um tribunal da Guatemala inabilitar o partido Semilla, de Arévalo, o que, na prática, impede que ele dispute o segundo turno. O candidato de esquerda denunciou uma perseguição política. A sentença gerou manifestações na Guatemala e críticas dos Estados Unidos, da União Europeia, Igreja Católica e do Chile. A decisão, contudo, foi revertida pela mais alta instância judicial da Guatemala, uma resolução da Corte de Constitucionalidade (CC).
Logo após a sentença polêmica, segundo a qual foram encontradas irregularidades na criação do partido, os dois candidatos foram oficializados para o segundo turno pelo Tribunal Supremo Eleitoral (TSE), o que gerou mais incertezas. Apesar do ocorrido e de sua chegada ao segundo turno ter sido uma surpresa, Arévalo domina as intenções de voto para a presidência. Uma pesquisa, realizada em conjunto pelo CID Gallup e a Fundação Liberdade e Desenvolvimento, divulgada na quarta-feira, 16, mostra Arévalo com 50%, contra 32% de Torres. Além disso, considerando apenas os votos válidos (sem os nulos e em branco), Arévalo tem 61% da preferência do eleitorado contra 39% de Torres. A pesquisa também indicou que 32% consideram que o filho do ex-presidente reformista Juan José Arévalo pode melhorar a situação do país, contra 20% que avaliam que Torres poderia conseguir isso.
O governo da Guatemala prometeu à OEA (Organização dos Estados Americanos) que fará uma transição transparente e que entregará o poder ao vencedor em janeiro, disse Luis Almagro, secretário-geral da organização. Ele visitou o país no começo do mês de agosto a convite do presidente direitista Alejandro Giammattei, após a crise política que se seguiu ao primeiro turno das eleições presidenciais de 25 de junho. Autoridades da Guatemala também convidaram a OEA “a participar do processo de transição” até 14 de janeiro, no contexto da Missão de Observação Eleitoral (MOE), mas “com especialistas políticos”, acrescentou Almagro, convencido de que a missão acalmou os ânimos.
Na Guatemala, o voto é voluntário e a reeleição é proibida. O presidente Alejandro Giammattei chega ao fim de seu mandato de quatro anos com um índice de desaprovação de 76%, segundo pesquisas. A pobreza e a violência levam milhares de guatemaltecos a emigrar para os Estados Unidos todos os anos. Com 71,1% de informalidade trabalhista, a Guatemala é um dos países mais desiguais da América Latina, segundo o Banco Mundial. Cerca de 10,3 milhões de seus 18,1 milhões de habitantes vivem na pobreza e metade das crianças menores de cinco anos sofre de desnutrição crônica, segundo a ONU. Outro problema avassalador é a insegurança, já que a taxa de homicídios na Guatemala é três vezes maior que a média mundial, segundo a ONU.
Sandra Torres é a ex-esposa do falecido presidente social-democrata Álvaro Colom (2008-2012), que apoiou a Comissão Internacional contra a Impunidade na Guatemala (CICIG), um organismo endossado pela ONU que funcionou como uma Procuradoria paralela e desvendou casos notórios de corrupção, entre 2007 e 2019. Nascida em 5 de outubro de 1955 no município de Melchor de Mencos, no norte, Sandra é formada em Comunicação e empresária do setor têxtil. Em 2002, divorciou-se de seu primeiro marido, com quem teve quatro filhos, antes de se envolver na política. Juntou-se à Unidade Nacional de Esperança (UNE), um partido de centro-esquerda que levou Colom ao poder e que ela agora lidera. “Lembrem-se que as mulheres são boas administradoras. Esticamos o dinheiro em casa e eu vou esticar no governo”, diz a ex-primeira-dama, de 67 anos.
Em 2003, ela se casou com Colom. Em 2011, se divorciou dele para poder disputar a Presidência e não infringir a norma constitucional que impede que familiares próximos dos presidentes em exercício sejam candidatos. A Justiça rejeitou sua candidatura. Ela foi detida em 2019 por suposto financiamento irregular na UNE, mas o caso foi arquivado em 2022. Torres foi derrotada por Jimmy Morales na eleição de 2015 e pelo atual presidente, Alejandro Giammattei, em 2019. Neste ano, porém, mostrou-se certa de conseguir derrotar qualquer rival neste segundo turno. “Com quem for (o segundo turno) vamos ganhar”, declarou. Um grande desafio para ela é a rejeição, que atinge 41,4% dos eleitores, segundo pesquisa do jornal Prensa Libre.
Bernardo Arévalo, de 64 anos, que concorre à presidência pela primeira vez, é um sociólogo e deputado federal que surpreendeu no primeiro turno. Ele é filho do ex-presidente Juan José Arévalo (1945-1951). Sobre seus ombros recai o legado de seu pai, que se tornou o primeiro presidente democrático após décadas de ditadura e acabou com os 13 anos de regime do caudilho Jorge Ubico, um admirador de Hitler que submeteu indígenas maias a trabalhos forçados. Ele nasceu em Montevidéu, no Uruguai, em 1958, devido ao exílio de seu pai na América do Sul e na França, depois que Jacobo Árbenz foi deposto em 1954 por uma invasão arquitetada pelos Estados Unidos. Árbenz foi o herdeiro do governo progressista de Arévalo, em uma década na qual foi criado o Instituto Guatemalteco de Seguridade Social, deu-se autonomia à Universidade Pública de San Carlos e aos municípios e foi permitido o voto de mulheres e analfabetos. Também nesse período foi construído um porto no Caribe, e outro, no Pacífico; uma rodovia para ligar a capital ao Atlântico e competir com a ferrovia da poderosa United Fruit Company.
O candidato de esquerda morou principalmente na França e no México e chegou à Guatemala aos 15 anos. Foi vice-chanceler em 1994-1995 e embaixador na Espanha entre 1995 e 1996, durante o governo do falecido presidente Ramiro de León Carpio. Durante a campanha eleitoral, como candidato do movimento Semilla, prometeu seguir os passos do pai para melhorar a educação, reduzir a violência e a pobreza que atinge 59% dos 17,6 milhões de guatemaltecos. Contudo, já disse que não vai legalizar o aborto — a legislação atual permite a prática apenas quando a vida da mulher estiver em perigo — nem o casamento igualitário. Ao mesmo tempo, afirma que não permitirá a discriminação, ou a estigmatização por gênero ou religião. Como não aparecia entre os favoritos, as pesquisas não mediram a rejeição a Arévalo.
*Com informações das agências internacionais
Fonte: Jovem Pan News
Comentários