Passados mais de 560 dias desde que o presidente da Rússia, Vladimir Putin, ordenou a invasão da Ucrânia, a guerra entre os dois países continua. Algumas poucas nações, todas com má relação com o Ocidente, juntaram-se aos russos. Já entre os que apoiam o país governado por Volodymyr Zelensky (a maioria esmagadora do mundo), os EUA são os maiores fomentadores, seja com contribuições militares, financeiras, humanitárias ou fornecendo armamento.

Durante a Guerra do Golfo, os militares dos EUA usaram urânio empobrecido em blindagem de tanques e em algumas munições, que devido à sua alta densidade, ajudou a penetrar veículos blindados inimigos. Crédito: Departamento Federal de Assuntos de Veteranos dos EUA (USDVA)

Nesse último quesito, destaca-se a recém-anunciada promessa de doação de balas de calibre 120 mm com urânio empobrecido, um tipo de munição considerado polêmico devido ao uso de material radioativo – capaz de “derreter” os inimigos. Vamos entender o porquê:

As munições fazem parte de um novo pacote de ajuda anunciado pelo chefe da diplomacia norte-americana, Antony Blinken, durante uma visita surpresa a Kiev na última semana.

Não há restrição formal para uso de munições radioativas

Durante a Segunda Guerra Mundial, a Alemanha nazista conduziu testes com projéteis desse tipo. Mas como o urânio era um material escasso e caro, as munições não chegaram a ser utilizadas.

Atualmente, sabe-se que balas radioativas são mantidas em arsenais de 21 países, tais como os EUA, a Rússia, a Turquia e a Arábia Saudita. Até agora, no entanto, apenas o governo norte-americano admitiu já ter utilizado esse tipo de munição em operações militares – no Iraque, na ex-Iugoslávia, no Afeganistão e na Síria.

Diferentemente das armas biológicas e químicas, das minas antipessoais e das bombas de fragmentação, as munições de urânio não são proibidas. Também não existe nenhum acordo internacional que condene explicitamente a utilização de urânio empobrecido – um recurso considerado covarde e, segundo a embaixada russa em Washington, um “sinal claro de desumanidade”.

Perigos da radiação por urânio empobrecido não são claros

De acordo com uma reportagem da Deutsche Welle (DW), emissora de TV alemã, embora seja menos tóxico que outros metais pesados (como o arsênico e o mercúrio) e fracamente radioativo em razão da sua longa meia-vida (bilhões de anos), não há pesquisas conclusivas sobre os riscos envolvidos no uso do urânio empobrecido.

(A meia vida de um elemento radioativo é o intervalo de tempo em que uma amostra desse elemento se reduz à metade. Esse intervalo de tempo também é chamado de período de semidesintegração).

No entanto, é comprovado a partir de diversos estudos laboratoriais que o elemento é tóxico para mamíferos, ataca o sistema reprodutivo e o desenvolvimento do feto causando fertilidade reduzida, abortos e deformações no nascituro.Testes citológicos mostram que, à exposição crônica, o urânio empobrecido é leucogênico, mutagênico e neurotóxico. 

Sabe-se que toda exposição à radiação ionizante envolve riscos, mas não há dados epidemiológicos conclusivos acerca da exposição humana ao urânio empobrecido e sua correlação com a ocorrência de patologias específicas como o câncer.

De qualquer modo, a questão do perigo a longo prazo é controversa entre os especialistas. No Iraque, por exemplo, houve um aumento significativo de relatos de deformidades, câncer e outros danos nas regiões onde munições de urânio foram utilizadas em grande escala.

Ainda assim, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) dizem que não existe risco radiológico para a população pela exposição ao urânio.

Além disso, um estudo encomendado pela Comissão Europeia em 2010 não apontou “qualquer evidência de riscos ambientais e para a saúde” decorrentes do urânio empobrecido. Por fim, também não se sabe ao certo até que ponto o solo e os lençóis freáticos podem ser contaminados pelo uso de projéteis de urânio empobrecido.