O avanço das superbactérias é um problema real. Diversos especialistas já alertaram para a necessidade de desenvolvimento de novo antibióticos. A questão é que não há empresas dispostas a atuar nesse sentido. E isso se deve a um modelo de negócios falido.

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Pedidos de falência são comuns

Empresas alegam que não é possível cobrir custos de desenvolvimento de novos antibióticos (Imagem: Fahroni/Shutterstock)

Caso do antibiótico da Nabriva Therapeutics

Cerca de 80% dos 300 cientistas que trabalharam nessas empresas abandonaram o desenvolvimento de antibióticos, de acordo com Kevin Outterson, diretor executivo do CARB-X, um grupo financiado pelo governo que promove pesquisas na área.

Um dos casos que exemplificam esse cenário é o da Nabriva Therapeutics. A empresa demitiu todos os seus funcionários neste ano e está procurando um comprador. Isso tudo apenas quatro anos depois que a FDA aprovou seu antibiótico Xenleta para pneumonia.

A Nabriva precificou um tratamento de cinco dias com o produto em mais de mil dólares, quase R$ 5 mil. Antibióticos genéricos para tratar pessoas que desenvolvem pneumonia fora dos hospitais normalmente custam menos de US$ 100, ou R$ 500. Menos de 100 dos 800 hospitais procurados pela empresa adquiriram o Xenleta.

Faltam incentivos ao desenvolvimento de novos produtos?

Para Ryan Cirz, cofundador da Achaogen, que pediu falência em 2019, menos de um ano depois que a FDA aprovou seu medicamento Zemdri para infecções complicadas do trato urinário, os novos antibióticos devem receber apoio semelhante aos tratamentos para doenças raras.

A lei fornece subsídios, incentivos fiscais e anos adicionais de exclusividade de mercado para farmacêuticas que desenvolvem tratamentos para doenças que afetam menos de 200 mil pessoas nos EUA.

O antibiótico da Achaogen foi desenvolvido para derrotar um tipo grave de infecção resistente que afeta cerca de 13 mil pessoas por ano nos Estados Unidos. Até metade dos pacientes hospitalizados acabam morrendo. Eles fazem parte da lista de mais de 35 mil pessoas que perdem a vida anualmente por infecções bacterianas ou fúngicas resistentes a medicamentos no país. E esse número tem aumentado nos últimos anos.

No ano em que Zemdri foi aprovado, a Achaogen gastou quase US$ 200 milhões, quase R$ 1 bilhão, na fabricação, marketing e outros custos, mas só gerou US$ 800 mil, quase R$ 4 milhões, em vendas da droga. O preço das ações da empresa caiu mais de 96% e o pedido de falência veio em 2019.

Muitas empresas que trabalhavam na criação de novos antibióticos fecharam as portas (Imagem: nokwalai/Shutterstock)

Novo modelo de pagamento é alternativa

Uma possibilidade para reverter esse cenário é olhar para o resto do mundo. O Reino Unido, por exemplo, iniciou em 2019 um modelo de assinatura para pagar às farmacêuticas por novos antibióticos com base em seu potencial valor para a saúde pública.

Os legisladores dos EUA estudam legislações semelhantes. Projetos de lei bipartidários reintroduzidos na Câmara e no Senado em abril destinaram US$ 6 bilhões, cerca de R$ 30 bilhões, para a compra de novos antibióticos para tratar infecções resistentes a medicamentos. Mas o assunto ainda não foi discutido pelos parlamentares e pode acabar sendo esquecido.