Não é de hoje que os cientistas sabem que Mercúrio vem encolhendo há bilhões de anos. Embora seja o planeta mais próximo do Sol, seu interior tem esfriado conforme o calor interno vaza – o que sugere que a rocha metálica que compõe o núcleo deve ter ligeiramente contraído em volume.
No entanto, não se tem conhecimento sobre até que ponto Mercúrio continua encolhendo atualmente – e, em caso afirmativo, por quanto tempo isso deve continuar. Um estudo publicado esta semana na revista Nature Geosciencetraz novos dados que podem conter pistas.
Para quem tem pressa:
Como o interior do planeta está encolhendo, sua crosta tem progressivamente menos área para cobrir. Como consequência, surgem “falhas de empuxo” na superfície – onde um trecho do terreno é empurrado sobre o terreno adjacente.
“Essa dinâmica equivale às rugas que se formam em uma maçã conforme ela envelhece, com a diferença que a fruta encolhe porque está secando, enquanto Mercúrio encolhe por causa da contração térmica de seu interior”, explica o coautor da pesquisa David Rothery, professor de geociências planetárias da Universidade Aberta do Reino Unido, em um artigo no site The Conversation.
Quando o encolhimento de Mercúrio foi percebido pela primeira vez
Segundo Rothery, a primeira evidência do encolhimento de Mercúrio foi detectada em 1974, quando a missão Mariner 10 transmitiu imagens de escarpas de quilômetros de altura (encostas semelhantes a rampas) serpenteando por centenas de quilômetros no solo.
Depois, o satélite Messenger, que orbitou o planeta de 2011 a 2015, mostrou muito mais “escarpas lobadas” (como ficaram conhecidas) por toda a crosta.
“A partir de tais observações, foi possível deduzir que falhas geológicas suavemente afundadas, conhecidas como empuxos, se aproximam da superfície abaixo de cada escarpa e são uma resposta ao fato de Mercúrio ter encolhido em raio em um total de cerca de 7 km”, diz Rothery.
E quando isso aconteceu? O cientista explica que a maneira adequada de descobrir a idade da superfície de Mercúrio é medindo a densidade das crateras de impacto. Quanto mais antiga a superfície, mais crateras. “Mas, esse método é complicado, porque a taxa de impactos que produzem crateras era muito maior no passado profundo”, explica o pesquisador.
De qualquer forma, sempre ficou claro que as escarpas de Mercúrio não são recentes, porque embora atravessem algumas crateras mais antigas, outras mais mais jovens são sobrepostas a elas e, portanto, as escarpas são mais velhas do que essas crateras.
O consenso é de que a maioria das escarpas de Mercúrio têm cerca de 3 bilhões de anos – mas será que todas são tão antigas assim? E as mais velhas deixaram de se mover há muito tempo ou continuam ativas?
Novo estudo traz respostas
Até agora, as informações eram escassas. “Mas nossa equipe encontrou sinais inequívocos de que muitas escarpas continuaram a se mover em tempos geologicamente recentes, mesmo que tenham sido iniciadas há bilhões de anos”, revelou Rothery.
O trabalho do time foi desencadeado quando o estudante de doutorado Ben Man notou que algumas escarpas têm pequenas fraturas em suas superfícies superiores esticadas. Ele interpretou essas fissuras como “grabens”, a palavra geológica para descrever uma faixa de terra caída entre duas falhas paralelas – uma fossa tectônica.
“Isso normalmente acontece quando a crosta é esticada”, explica Rothery. “O alongamento pode parecer surpreendente em Mercúrio, onde no geral a crosta está sendo comprimida, mas Man percebeu que esses grabens ocorreriam se uma fatia de crosta de empuxo fosse dobrada ao ser empurrada sobre o terreno adjacente”.
Segundo as observações da pesquisa, os grabens têm menos de um quilômetro de largura e quase 100 metros de profundidade. Rothery destaca que tais características comparativamente pequenas devem ser muito mais jovens do que a estrutura antiga em que se assentam, caso contrário, já teriam sido apagadas de vista por impactos jogando material pela superfície em um processo chamado de “jardinagem de impacto”.
Com base na taxa de borramento resultante da jardinagem de impacto, os pesquisadores calcularam que a maioria dos grabens tem menos de 300 milhões de anos. Isso sugere que o último movimento deve ter acontecido tão “recentemente” quanto.
Analisando os dados da missão Messenger, Man encontrou 48 grandes escarpas lobadas que contêm pequenos grabens. Outras 244 eram encabeçadas por grabens “prováveis” – que não são vistos com clareza suficiente nas imagens.
Estes são agora os principais alvos para confirmação pelo sistema de imagens da missão conjunta europeia e japonesa BepiColombo, que deve começar a operar em órbita ao redor de Mercúrio no início de 2026.
No entanto, segundo Rothery, a sonda não pousará no planeta. “Portanto, não temos perspectiva de coletar dados sísmicos sobre Mercúrio. Mas, além de mostrar pequenos grabens com mais clareza, as imagens mais detalhadas da missão podem revelar rastros de rochas que podem ser evidências adicionais de terremotos recentes. Estou ansioso para descobrir”.
Fonte: Olhar Digital
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