Aplicativos e tecnologias novas surgem tão rapidamente que é difícil acompanhar. No entanto, alguns serviços podem prometer muito na teoria, mas não entregar o esperado. Em outros casos, o usuário ainda pode se colocar em risco. Estamos falando, mais especificamente, dos rastreadores de celulares, que podem ser até mesmo ilegais dependendo da aplicação.

Entre esses serviços está o Eyezy, que promete fazer um rastreamento minucioso de celulares com a intenção de trazer mais segurança para pais e filhos na hora do manuseio da internet. Mas, esse serviço realmente funciona? E, mais importantemente, é seguro?

O que é o Eyezy?

Visando auxiliar os pais a acompanhar o conteúdo que seus filhos consomem na internet e controlar e restringir certos tipos de entretenimento, o Eyezy promete o monitoramento total de celulares e computadores dos filhos, dando o acesso completo aos pais.

De acordo com o site oficial da ferramenta, ao usá-la, é possível visualizar desde um SMS recebido até com quem a pessoa monitorada está conversando ou trocando fotos, por exemplo.

Além disso, de acordo com nota publicada pela empresa responsável, é possível verificar em tempo real o que o usuário está vendo e consumindo com imagens ao vivo da tela do smartphone da pessoa.

Outra função a ser destacada é a diferenciação de contatos. A exemplo, quando a pessoa monitorada recebe uma mensagem que não consta na agenda de contatos, o administrador será notificado automaticamente. Ou quando o usuário hospedeiro for em um perímetro onde os pais, por exemplo, não permitiram, o celular do administrador do aplicativo irá receber uma notificação.

LGPD

Instituída em 2018 e aplicada a partir de agosto de 2019, a Lei de Gerenciamento e Proteção de Dados, LGPD, regula as atividades de tratamento de dados pessoais no Brasil e modifica os artigos 7 e 16 do Marco Civil da Internet.

O Eyezy fere a lei?

Baseado nas funções apresentadas no site oficial da Eyezy, a ferramenta infringe diretamente o artigo 7 do marco Civil da Internet de 23 de abril 2014. Já que o mesmo promete o acesso total aos dados do usuário que hipoteticamente estaria sendo vigiado pelos pais.

Como segue logo abaixo, infringir a vida privada e informações de um usuário sem o consentimento deste é considerado crime pela legislação brasileira.

1 – Inviolabilidade da intimidade e da vida privada, sua proteção e indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
2 – Inviolabilidade E sigilo do fluxo de suas comunicações pela internet, salvo por ordem judicial, na forma da lei;
3 – Inviolabilidade E sigilo de suas comunicações privadas armazenadas, salvo por ordem judicial;
Segundo a Lei Carolina Dieckmann (lei n.º 12.737/2012), considerando os artigos 154-A e 154-B do Código Penal. A invasão de dispositivos informáticos com o fim de obter, adulterar ou destruir dados, ou informações sem autorização expressa, ou tácita do proprietário é cabível a pena de reclusão. Com 6 meses a 2 anos, mais multa, caso a conduta não constitua crime mais grave.

Vale ressaltar que a penalização pode ser ampliada para quatro a oito anos de reclusão. Tendo em vista a aprovação da Lei 14.155/2021, que estabelece pena aos crimes no ambiente digital. Dentre eles, a violação de dispositivos informáticos, o furto e o estelionato cometidos pela internet ou por meio de dispositivos eletrônicos.

Imagem de uma das abas do site oficial da marca
O Eyezy entre suas funcionalidades traz o controle de mensagens do aparelho hospedeiro. (Imagem: Lucas Gabriel MH)

Eyezy no Reclame Aqui

De acordo com informações publicadas no site Reclame Aqui, o Eyezy não é um aplicativo que cumpre com os pré-requisitos básicos de segurança da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados). Além disso, o app soma dezenas reclamações pelo seu péssimo funcionamento. Até o fechamento dessa reportagem, nenhuma delas havia sido respondida pela empresa responsável.

Entre os depoimentos mais frequentes estão: “Não cumpre com o prometido”, “Propaganda enganosa”, “Não consegue o reembolso ou cancelamento” e “Não entrega o que promete”.

A princípio o Reclame Aqui notifica que a empresa se enquadra como ‘Não Recomendada’, pois não responde a pelo menos 50% das reclamações recebidas.

Especialista comenta sobre LGPD e serviços online

Diante de tudo isso, o Eyezy pode ser um risco à segurança do usuário e da pessoa vigiada. A especialista em segurança e Policial Penal, Luciana Nogueira, respondeu algumas questões sobre privacidade de dados e leis na Internet. Confira logo abaixo:

Quais são os principais riscos associados à invasão de privacidade de dados?

Como profissional da área de segurança, o risco do vazamento de dados pessoais toma uma proporção que ultrapassa a esfera da pessoalidade. Pois o profissional de segurança pública possui família, amigos, vida social, indo além do trabalho.

O risco desses dados serem roubados e manipulados por indivíduos mal-intencionados pode causar danos morais e materiais, chantagens, além de proporcionar mapeamento e localização em tempo real do agente de segurança e demais pessoas envolvidas.

Luciana Nogueira

Imagem simulando uma invasão de segurança de dados
A segurança de dados hoje é protegida pela lei do marco da internet de 2014 e pela LGPD de 2019. (Imagem: Lucas Gabriel MH)

Quais informações pessoais são mais suscetíveis a invasões de privacidade?

Sobre os dados que mais arriscam serem saqueados pela internet, Luciana ressalta que o registro de CPF, dados de endereço residencial, dados de endereço de trabalho, estão entre os mais roubados.

Não se deve compartilhar dados pessoais como número de registro de identidade, CPF, informações de residência e endereço de trabalho em redes sociais ou em plataformas de sites suspeitos.

Além disso, é importante não compartilhar suas imagens pessoais sem critérios de segurança. A especialista também afirma que, devido à ampla disseminação das inteligências artificiais, os riscos estão em constante aumento.

“A Inteligência Artificial (IA) tem sido muito difundida. Aplicativos de manipulação de imagens prometem melhorar “Selfies”, mas ao passo em que nossas fotografias de rosto são enviadas para esses aplicativos, cedemos os direitos autorais de nossa própria imagem para os desenvolvedores poderem usá-las no intuito de aprimorar o aplicativo. ”

Com isso, encontramos o risco de a imagem ser distribuída sem autorização do proprietário e hackers utilizarem a foto para cometer crimes se passando pelo dono da imagem, utilizando, por exemplo, o “golpe do Pix” via WhatsApp, ou desbloqueando algum dispositivo que requer reconhecimento biométrico usando a imagem.

Em suma, de acordo com Luciana, o risco de a imagem ser distribuída sem autorização do proprietário e hackers utilizarem a foto para cometer crimes se passando pelo dono da imagem é muito grande. Dentre os golpes está o do Pix, geralmente aplicado pelo WhatsApp, ou desbloqueando algum dispositivo que requer reconhecimento de biométrico usando a imagem

Quais são as principais consequências para os indivíduos afetados por uma invasão de privacidade de dados?

Luciana frisa que um indivíduo que tenha fotos íntimas divulgadas sem autorização por meio de uma invasão em seu sistema, pode sofrer sérios danos psicológicos por afetar em casos como esse a moral da vítima.

Assim, sua privacidade fica exposta e podem ocorrer danos materiais em determinadas situações. Isso pode afetar a reputação da vítima perante uma empresa que contratou seus serviços, levando à demissão e resultando em prejuízo financeiro.