Entre as várias consequências da crise climática está a possibilidade de ressurgimento de antigos vírus que estão congelados há milhares de anos na região da Sibéria. O mais novo alerta sobre essa questão sanitária é do virologista Jean-Michel Claverie.

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Impactos do aquecimento global

Alerta sanitário

No ano passado, a equipe de Claverie publicou pesquisas mostrando que eles extraíram múltiplos vírus antigos do permafrost siberiano, todos os quais permaneceram infecciosos.

Com a mudança climática, estamos acostumados a pensar nos perigos vindos do sul. Agora, percebemos que pode haver algum perigo vindo do norte, à medida que o permafrost descongela e libera micróbios, bactérias e vírus.

Jean-Michel Claverie, virologista

O perigo já é conhecido. Uma onda de calor na Sibéria no verão de 2016 ativou esporos de antraz, levando a dezenas de infecções, matando uma criança e milhares de renas.

Já em julho deste ano, uma equipe separada de cientistas publicou descobertas mostrando que até mesmo organismos multicelulares poderiam sobreviver às condições do permafrost em um estado metabólico inativo, chamado criptobiose.

Uma ameaça que deixa, inclusive, a Organização Mundial da Saúde (OMS) em alerta.

A OMS trabalha com mais de 300 cientistas para analisar as evidências de todas as famílias de vírus e bactérias que podem causar epidemias e pandemias, incluindo aquelas que podem ser liberadas com o descongelamento do permafrost.

Margaret Harris, porta-voz da OMS

Aquecimento global pode “reviver” vírus responsável pela próxima pandemia (Imagem: Kateryna Kon/Shutterstock)

Vírus podem “voltar à vida”

Claverie mostrou pela primeira vez que vírus “vivos” podem ser extraídos do permafrost siberiano e revividos com sucesso em 2014. Por razões de segurança, sua pesquisa se concentrou apenas em vírus capazes de infectar amebas, que estão suficientemente distantes da espécie humana para evitar qualquer risco de contaminação acidental. Mas ele sentiu que a escala da ameaça à saúde pública indicada pelos resultados havia sido subestimada ou considerada erroneamente uma raridade.

Portanto, em 2019, sua equipe isolou 13 novos vírus, incluindo um congelado sob um lago há mais de 48.500 anos, de sete diferentes amostras antigas de permafrost siberiano —evidência de sua ubiquidade.

Publicando os resultados em um estudo de 2022, ele enfatizou que uma infecção viral de um patógeno desconhecido e antigo em humanos, animais ou plantas poderia ter efeitos potencialmente “desastrosos”.

O permafrost, solo que um dia estava repleto de vida animal, oferece condições perfeitas para preservar matéria orgânica: é natural, escuro, sem oxigênio e permite pouca atividade química. Na Sibéria, pode atingir até um quilômetro de profundidade —o único lugar do mundo onde o permafrost vai tão fundo— e cobre cerca de dois terços do território russo. Em apenas um grama é possível encontrar milhares de espécies de micróbios dormentes, de acordo com um artigo publicado na revista Nature em 2021.