Líderes de grandes empresas de tecnologia participaram da TechLive, conferência anual sobre o tema do The Wall Street Journal, realizada esta semana.

As discussões foram focadas nas mudanças em ritmo acelerado causadas pela inteligência artificial (IA) nos negócios, tecnologia e elaboração de políticas. A seguir, confira alguns dos principais pontos debatidos.

Negócio de IA

A IA é o tópico central neste ano, com seu impacto nos negócios e sociedade. O CEO da OpenAI, Sam Altman, indicou duas coisas que vão importar nas próximas décadas são inteligência e energia abundantes e baratas.

Michael Wolf, cofundador e CEO da consultoria Activate, entende que os consumidores vão flutuar entre TikTok, ChatGPT e outros apps enriquecidos com a IA generativa ao invés de usarem mecanismos de buscas tradicionais.

Ele prevê que o domínio na indústria de pesquisa de US$ 100 bilhões (R$ 505,7 bilhões) está “disponível”. Ele acrescentou que a ascensão dos modelos de IA de código aberto abre caminho para as empresas de menor porte competirem mais significativamente com empresas grandes e estabelecidas.

IA: tratar como humana ou explicitar que é artificial?

Sobre as crescentes confusões que a IA causa (não sabemos se certo conteúdo é produzido por uma pessoa ou por uma IA, por exemplo), Sam Altman disse que ele e seus colegas optaram por não dar ao ChatGPT um nome humano para evitar que os usuários não o confundissem com uma pessoa de carne e osso.

Porém, não foi esse o raciocínio da Meta, segundo Chris Cox. Ele afirmou que a empresa de Mark Zuckerberg optou por caracterizar seus chatbots como pessoas para aumentar seu engajamento. para ele, os usuários querem interagir com uma ferramenta que tenha personalidade, não apenas que se sinta um robô.

No mês passado, a Meta revelou seus chatbots de IA baseados em celebridades, como Naomi Osaka e Snoop Dogg. Cox ainda deixou claro que esses personagens não são pessoas reais e que a Meta indica, logo no início da conversa, que o usuário não está falando com a pessoa, mas com uma IA.

Ter produtos que experimentam o que é possível é ótimo, mas ter algo que não deixe claro para as pessoas o que está acontecendo é um problema.

Chris Cox, CPO da Meta Platforms

Inteligência Artificial Geral
Imagem: Pdusit/Shutterstock

IA x trabalho humano

Sobre a preocupação de diversos profissionais acerca de que a IA irá suplantar postos de trabalho, Sam Altman disse que “cada revolução tecnológica afeta o mercado de trabalho. Não me preocupa muito”.

Essa é a forma de progredirmos. E encontraremos novos e melhores empregos. O que acho que precisamos confrontar como sociedade é a velocidade na qual isso acontecerá.

Sam Altman, CEO da OpenAI

Altman prosseguiu, alegando que as mudanças podem atingir mais seriamente algumas pessoas no cenário econômico do que a outras, mesmo se a sociedade evolua.”Todos teremos que fazer algo sobre essa transição”, disse.

Esses sistemas serão lançados ao longo do tempo, gradualmente; as pessoas terão que se adaptar a eles e tudo ficará bem.

Adam Wenchel, CEO da Arthur

“Mesmo nos níveis mais altos, ainda estamos tentando descobrir o que tudo isso significa para nosso modelo de negócio”, pontuou Vince Marin, CIO do escritório de advocacia Sidley Austin.

Espera-se que a IA transforme a economia global ao conduzir os ganhos, tanto com produtividade, como com crescimento. Porém, economistas e empreendedores de tecnologia não entraram em consenso sobre quão rápido isso deve ser, tampouco se deve acontecer.

Vinod Khosla, capitalista de investimentos de risco e fundador da Khosla Ventures, que está no mercado há 20 anos e que foi uma das primeiras a financiar a OpenAI, tem certeza que, em dez anos, a IA poderá “fazer 80% dos 80% de todos os empregos que conhecemos hoje”.

Durante a fala, ele indicou vários tipos de médicos e contadores que podem ser substituídos pela IA, pois esse sistema tem condições de acessar ampla gama de conhecimentos.

Khosla ainda comparou o momento atual com o fim dos empregos agrícolas nos EUA no século XX, algo que ocorreu com o passar de gerações, e não de anos.

O investidor de risco alega, contudo, que a prosperidade crescente que a IA trará à sociedade que a adotar poderá permitir que as pessoas que não querem trabalhar consigam atingir esse objetivo.

Acredito que a necessidade de trabalhar na sociedade desaparecerá em 25 anos para os países que adaptarem estas tecnologias. Acho que há espaço para uma renda básica universal que garanta um padrão mínimo e que as pessoas possam trabalhar nas coisas que desejam.

Vinod Khosla, capitalista de investimentos de risco e fundador da Khosla Ventures

Já Elise Smith, CEO da Praxis Labs, afirmou ser crítico envolver a próxima geração de trabalhadores nas discussões sobre como usar a tecnologia. “Eles querem ser trazidos e acompanhados durante a jornada. Eles querem realizar o dia da inovação, o hackaton, onde darão ideias sobre como a IA pode transformar seus negócios.”

David Wadhwani, presidente do negócio de mídia da Adobe, indicou que, apesar dos receios, ele enxerga a IA como ferramenta que vai fortalecer as contratações de pessoas ao invés de demiti-las.

Wadhwani afirmou ainda que ferramentas, como a Adobe Firefly, que gera logos e imagens, vão permitir que mais pessoas se tornem profissionais criativos. “Teremos profissionais criativos se tornando mais produtivos do que antes e mais profissionais criativos no mundo.”

O CEO da Arm, Rene Haas, compartilhou que sua empresa de chips está usando a IA para ajudar em algumas áreas nas quais tem dificuldade em contratar talentos necessários, como responsáveis por debugar aplicações e testar chips.

Em contraste, ele entende que a indústria de semicondutores enfrenta alguns desafios em seu papel de fortalecer a IA. Ele descreveu um futuro no qual a escassez de energia pode restringir o avanço da tecnologia, e a escassez de talentos pode limitar a produção dos compostos.

O tipo de pessoas que buscamos contratar é difícil de achar. Buscamos engenheiros verdadeiramente especialistas.

Rene Haas, CEO da Arm

“Muitos dos investimentos em IA, hoje em dia – investimentos de risco – perderão dinheiro”, afirmou Khosla, que disse ainda que os investimentos em IA entrou em um ciclo de hype, e apenas investidores altamente disciplinados vão colher os benefícios da tecnologia transformativa.

Candidato esperando entrevista de emprego sentados ao lado de um robô com IA (inteligência artificial)
Imagem: Stokkete/Shutterstock

Erros da tecnologia

Claro que nem tudo são flores. Alguns bugs e erros crassos também geraram preocupações. “Temos tarefa difícil pela frente para descobrir e compreender quais são essas desvantagens e construir ferramentas necessárias para mitigá-las”, disse a CTO da OpenAI, Mira Murati.

Fizemos toneladas de progresso no problema da alucinação do GPT-4, mas ainda não estamos onde deveríamos estar. Estamos meio que no caminho certo.

Mira Murati, CTO da OpenAI

A OpenAI continua usando técnicas, como reforço de aprendizado com feedback humano, para reduzir as vezes nas quais o modelo cria informações. Ela também funciona na detecção da proveniência de imagens, alega Murati.

Já Suleyman, do Pi, apontou outro problema: os chatbots de IA não são desenhados para duvidar de si, o que faz ser mais difícil a tarefa de saber quando estão errados.

Contudo, ele sugeriu como possível salvaguarda aos usuários respostas ranqueadas por sua precisão. “Essa habilidade de estimativa incerta é parte crítica da inteligência e é chave para torná-las confiáveis”, completou.

Ele também afirmou que ele e seus pares discutem o risco potencial da IA interferir nas próximas eleições presidenciais nos EUA, e espera construir parâmetros que vão prevenir o Pi de recomendar candidatos.

O CEO da Roblox, David Baszucki, afirmou que a empresa de games está levando com calma quando se fala em treinar modelos de IA e que não está coletando o código de ninguém sem permissão. “Esta é uma grande discussão da sociedade agora.”

Sobre o gasto energético realizado pelos modelos de IA, algo que preocupa especialistas no clima, o CTO da Meta, Mike Schroepfer, alegou que a IA vai economizar energia de outras formas. “Haverá grande consumo de energia, mas você também deve pensar nos custos de substituição”, disse, em referência às eficiências que se espera que a IA proveja.

IA no mundo do entretenimento

Representando o universo musical, que também vem sofrendo com a IA, o cantor John Legend – que está lançando sua primeira startup de tecnologia – concordou que a tecnologia tem seus limites.

Ele disse que a música gerada por computador não irá substituir os compositores, em parte porque as audiências gostam da história por trás das letras das canções.

Há ainda algo que é tão humano na música, nas composições e na interação que temos com nosso público.

John Legend, cantor

Do lado de Hollywood, o ator Arnold Schwarzenegger se diz ciente do uso da IA em Hollywood (assunto que causou a atual paralisação de roteiristas e atores por lá) e chegou a ouvir a verão fake de sua voz feita via IA recentemente.

Seja ou a imagem de Schwarzenegger utilizada pela IA no futuro, será algo a ser negociado pelos filhos do ator de 76 anos, segundo ele. “Não estarei por perto, mesmo se quisesse viver para sempre.”

Ilustração de inteligência artificial falando
Imagem: ArtemisDiana/Shutterstock

Tecnologia na geopolítica

Acerca das incertezas sobre a IA, os líderes de tecnologia também começaram a lidar com questões críticas sobre o impacto da geopolítica no setor.

Khosla disse que vencer a corrida para desenvolver IAs avançadas pode dar aos EUA vantagens política e econômica ante a China.

Penso que o sistema político mundial, que influencia o sudeste da Ásia, África e América Latina, está em jogo. Os valores do Ocidente estão em jogo nesta batalha tecnológica, então, deveríamos fazer tudo o que pudermos para ganhar esta batalha e derrotar a China.

Vinod Khosla, capitalista de investimentos de risco e fundador da Khosla Ventures

O investidor de risco condenou liberar o código por trás das IAs avançadas para o público, já que alguns peritos em tecnologia defendem que esse movimento fortaleceria o desenvolvimento da tecnologia.

“Você não tornaria o Projeto Manhattan um código aberto”, afirmou, se referindo aos esforços clandestinos dos EUA para comprar uma bomba atômica no período da Segunda Guerra Mundial.

A guerra entre Israel e Hamas também foi foco do evento deste ano. Palmer Luckey, fundador da empresa de tecnologia Anduril Industries, alegou que os chefes do Executivo estadunidense poderiam ser mais incisivos em seu suporte a Israel.

É muito negativo para nossa classe bilionária o fato de não se ver um esforço de todo o país para se envolver e falar abertamente sobre estas questões. Que você está vendo uma cobertura da condenação do Hamas por medo de dizer a coisa errada, seja no tribunal da opinião pública ou porque isso prejudica os seus interesses comerciais.

Palmer Luckey, fundador da Anduril Industries

Por fim, Charlie Shrem, sócio da Druid Ventures, disse que o uso de criptomoedas pelo Hamas para financiar seus ataques a Israel “é muito triste”.