Uma imagem aérea da região de Diego de Almagro expõe uma estrutura que completamente foge da normalidade: o estádio El Cobre é um oásis no deserto. Literalmente. Lá, o Cobresal constrói uma história singular no futebol sul-americano. Nesta semana, o clube soube que irá enfrentar o São Paulo na fase de grupos da Libertadores. Acostumado a “milagres”, a equipe tentará mais um na Libertadores.
O início de temporada com três derrotas e um empate está longe de ser promissor, mas as memórias de um tempo onde o “milagre do deserto” surpreendeu o Chile trazem um alento. Quem vive em Diego de Almagro é a prova de que milagres, de fato, acontecem.
Fundado em 1979 por trabalhadores locais e nomeado em referência a mineradora da região, o Cobresal foi, desde o início, carregado nos braços de seus torcedores. Que nunca foram muitos, já que o município de El Salvador tem uma população de menos de 10 mil pessoas. Bastián Monterrey, diretor de comunicações do Cobresal, conversou com a reportagem e contou um pouco dessa relação.
“Para El Salvador, foi um sonho ter uma equipe de futebol. Por isso, no final da década de 1970, a cidade propôs ter uma equipe profissional. Precisavam de um estádio com estrutura e, com a ajuda da empresa estatal Codelco e trabalhadores dela, construíram o estádio e da mesma forma, em 1999, com a ajuda do povo, ergueram as torres de iluminação”, contou.
No meio do deserto do Atacama, os trabalhadores e mineradores ergueram o estádio El Cobre, um oásis no deserto, um “monumento” que passou a ser, para muitos, a única opção de lazer da região. Felipe Escobillana, editor do site Redgol, principal diário esportivo do Chile, falou com a reportagem sobre a importância do estádio para a comunidade.
“O estádio El Cobre é um oásis no meio do deserto, já que El Salvador é um acampamento minerador de uma população flutuante. Na verdade, a capacidade do estádio é maior do que a população que vive no acampamento”, contextualizou.
Entender um pouco sobre a origem de El Cobre é, também, entender as origens do Cobresal. Mas o oásis do deserto não será a casa do time na Libertadores. Apesar de ter recebido o torneio na década de 1980 e em 2016, El Cobre não atendeu as novas exigências da Conmebol e o Cobresal terá de jogar em Calama, no estádio Zorros do Deserto, casa do Cobreloa. Bastián Monterrey, que é, também, um torcedor do clube, garantiu que todos na cidade lamentaram muito a decisão.
“É uma pena, pois El Salvador não tem mais que nove mil habitantes e o Cobresal é um clube que envolve muitas famílias, não chegamos a mais de mil pessoas por jogo, e não poder jogar na nossa casa é uma pena”, lamentou.
A união entre clube e comunidade fará muita falta na Libertadores. Jogando longe de casa, o Cobresal se sentirá um pouco órfão no torneio, apesar de o presidente do Cobreloa considerar as equipes “da mesma família, como primos”, pelas origens similares. O Cobresal é uma rara exceção na primeira divisão do futebol chileno, já que ainda segue o modelo associativo e, portanto, “pertence aos sócios e a El Salvador. O Cobresal e seu povo formam uma entidade que trabalham em conjunto”, destacou Bastián.
“El Salvador é um acampamento minerador e o Cobresal é muito importante para eles, a grande atração da cidade. Colocaram no time o apelido de ‘Insuportavelmente vivos’, porque muitas vezes a equipe é criticada por contar com pouca torcida (devido a ser de uma microrregião)”, endossou Felipe.
O Cobresal conquistou nos primeiros anos de profissionalismo a segunda divisão do Chile e a Copa do Chile. Disputou, em 1986, a Libertadores da América, e terminou a edição invicto, mas com apenas um triunfo: foram cinco empates. A vitória foi justamente contra a Universidad Católica, com gol de Manuel Pedreros.
O clube voltaria ao cenário internacional três décadas depois, após um feito que ninguém esperava: em 2015, o Cobresal conquistou o Clausura chileno, maior título da história do clube.
“O título foi nomeado como ‘o milagre do deserto’ pela imprensa, já que o Cobresal ganhou em cima de Colo-Colo e Universidad Católica, duas equipes grandes. E teve muita emoção, porque o Cobresal faturou o título em casa, enquanto a Católica empatou com o Iquique depois de abrir 3 a 0”, lembra Felipe Escobillana.
A combinação de resultados aconteceu na penúltima rodada, quando o Cobresal venceu o Barnechea por 3 a 2, também com drama: os visitantes haviam aberto 2 a 0. A virada, e o tropeço da Católica, resultaram no “Milagre do Deserto”.
Na Libertadores de 2016, o Cobresal teve pelo caminho um brasileiro: o Corinthians. O Timão foi ao El Cobre e venceu por 1 a 0, gol contra do zagueiro Miguel Escalona. Em São Paulo, o Timão goleou por 6 a 0. Eliminado, o Cobresal só venceu uma partida, contra o Cerro Porteño, do Paraguai, em casa.
Nos últimos anos, o Cobresal conseguiu se firmar como uma força do deserto do Atacama no Campeonato Chileno, superando o “primo” Cobreloa, que só voltou para a elite com o título da segunda divisão em 2023.
“O Norte do Chile sempre teve o Cobreloa como a equipe mais importante. Nos últimos anos, com a queda do Cobreloa, que não é campeão há 20 anos, o Cobresal conseguiu ser um representante importante na elite”, ressaltou Felipe.
Na última temporada, o Cobresal ficou perto de outro milagre e foi vice-campeão chileno, apenas um ponto atrás do Huachipato. A derrota para o Unión Española, por 1 a 0, na última rodada, custou o bicampeonato dos Mineiros. Apesar da boa campanha, a imprensa local não acredita que o time poderá fazer frente ao São Paulo no grupo B da Libertadores.
“Sinceramente, o Cobresal precisaria de uma grande surpresa para complicar o São Paulo. A mesma coisa para o Talleres e o Barcelona. De repente pode lutar por um terceiro lugar para jogar a Copa Sul-Americana, mas só a altitude de Calama (2.300 metros acima do nível do mar) pode ser um grande obstáculo (para os outros times). No Campeonato Chileno, começaram mal, não ganharam e o plantel é de poucos jogadores. Se eles focam na Libertadores, certamente podem ficar nas últimas posições (no campeonato nacional)”, analisou o jornalista.
O técnico Gustavo Huerta tenta ser um pouco mais otimista, apesar de reconhecer o favoritismo das outras equipes do grupo. “Nos dão zero chances, principalmente pelo início ruim do campeonato. Mas queremos fazer boas partidas”, começou por dizer.
“São equipes grandes. O São Paulo, com toda a sua história, o futebol brasileiro, que está muitos passos distante do nosso futebol. Barcelona, a equipe mais importante do futebol equatoriano… Talleres também vem bem. Vai ser difícil, para alguns impossível, mas estamos nisso, vamos tentar fazer o máximo para representar o nosso país”, prometeu.
Fonte: Ogol
Comentários