Petrobras (PETR4): não há contradição entre distribuir grandes dividendos e investir, diz economista-chefe do Banco Master
Em 2022 a Petrobras (PETR4) bateu recorde no pagamento de dividendos ao distribuir R$ 8,1 trilhões para seus acionistas. Com isso a petroleira brasileira foi a segunda empresa que mais pagou dividendos no mundo, atrás apenas da BHP.
Porém, no segundo trimestre de 2023, com o aumento dos investimentos, a empresa também anunciou o maior corte de dividendos do mundo. Ainda assim, a petroleira ficou com a terceira posição entre as maiores pagadoras de proventos da bolsa brasileira: R$ 7,24 por ação.
Para o economista-chefe do Banco Master, Paulo Gala, o nível de distribuição de dividendos que a Petrobras alcançou nos últimos anos dependeu da capacidade de investimento da empresa no passado, que elevou em até sete vezes a eficiência da companhia na extração de petróleo.
“Vale lembrar que a Petrobras está conseguindo extrair o petróleo do pré-sal ao custo de US$ 6 a US$ 7. Anteriormente, se estimava que custaria algo em torno de US$ 30 a US$ 40. Ela conseguiu fazer (a exploração), com os investimentos em dez anos, a um custo de extração baixíssimo, por isso ela tem essa lucratividade gigantesca”, diz Gala.
Para o economista, não há contradição entre oferecer dividendos atraentes ao mercado e investir pesadamente para aumento da produtividade.
“Ela (Petrobras) tem uma rentabilidade tão grande, uma eficiência tão grande, que eu acho que é bastante possível atender essas duas demandas”, avalia.
Para o setor de commodities, o economista diz que “é preciso tomar cuidado”, especialmente no caso das commodities metálicas. Um dos motivos é o desempenho do mercado imobiliário chinês, grande cliente de gigantes brasileiras, como a Vale (VALE3), segunda maior empresa da bolsa.
“Eu não vejo uma recuperação do setor imobiliário no horizonte. O que a China tem conseguido fazer é crescer, apesar da crise imobiliária, o que é uma façanha”, avalia.
Além disso, o setor imobiliário americano, outro grande comprador de commodities como minério de ferro e aço brasileiros, também não traz boas perspectivas. “(O segmento de) lajes corporativas está muito ruim, não há expectativa de expansão”.
Para o setor, portanto, ele avalia que “faz mais sentido” para o investidor da bolsa “ficar vendido” com relação a gigantes como Vale, CSN e outras.
Gala tem tom elogioso para o papel do ministério da Fazenda sob o comando de Fernando Haddad e diz que a pasta “está se saindo mais fiscalista do que se imaginava” e que o Congresso, apesar do caráter mais liberal que ganhou na última eleição, esteve menos atento ao controle de gastos do que se poderia imaginar, com a casa bancando pautas como o Perse e a desoneração da folha.
“Havia essa ideia de que um Congresso mais liberal poderia colocar uma agenda de mais controle de gastos. Contudo, no final, a gente acabou vendo uma coisa invertida. A Fazenda com maior preocupação de controle de gastos, em muitos casos, do que o próprio Congresso”, diz Gala.
Ainda sobre política, o economista avalia que o governo não vai comprar briga para colocar em curso uma reforma da renda agora, depois de ter dispendido energia para aprovação da reforma tributária, que, segundo ele, “é um grande passo”, apesar de estar “longe de ser uma reforma ideal”.
Leia a entrevista.
Paulo Gala, economista-chefe do Banco Master: Havia essa ideia de que um Congresso mais liberal poderia colocar uma agenda de mais controle de gastos. Contudo, no final, a gente acabou vendo uma coisa invertida.
A Fazenda com maior preocupação de controle de gastos, em muitos casos, do que o próprio Congresso. Mas eu acho que o DNA do Congresso ainda é mais liberal. Apesar dessas pautas-bomba e esses exemplos que você citou, de um modo geral, não acho que o Congresso tenha DNA de muito gasto público.
Então, no final do dia, a gente acaba tendo uma surpresa positiva, porque a Fazenda está se saindo mais fiscalista do que se imaginava. E o Congresso tem esse DNA de partidos mais liberais. Então, apesar dos pesares, eu acho que pode ter uma conjunção de tanto o Executivo quanto o Legislativo trabalharem em prol do controle das contas.
Paulo Gala: Acho que sim. Tem as questões como Perse e desoneração, questões que o Congresso está batendo o pé, mas o DNA do Congresso é um DNA mais liberal. Não acho que há maioria gastadora do Congresso. Acho que é uma boa composição o que a gente tem, na verdade.
Acho que é um grande passo. Está longe de ser uma reforma ideal, mas é um passo impressionante que a gente deu no sentido de aumentar a eficiência tributária. Temos coisas ridículas no Brasil do tipo uma fábrica que decide se instalar há dois mil quilômetros de distância do centro consumidor dela porque ao fazer isso ela ia economizar impostos. Então, ela botava o caminhão rodando no país inteiro só pra poder fazer a tal da arbitragem tributária. Finalmente, (a reforma) vai acabar com essa coisa de guerra fiscal.
Com a tributação no destino, desonera investimentos e exportação. A alíquota do valor adicionado é alta, mas é só um reflexo do fato de que a gente não consegue cobrar tributos por outros mecanismos.
Essa é a crítica que se faz da alíquota do valor adicionado. Ela se mantém alta, mas, agora, as pessoas vão poder enxergar o quanto elas estão pagando de imposto no consumo porque não pagam na renda. O estado precisa cobrar de algum lugar e como a gente tem um imposto de renda relativamente baixo na pessoa física, acaba que as pessoas acabam pagando muito no consumo. A reforma é legal porque explicita isso. Dá mais transparência.
Paulo Gala: (A possível reforma da renda) é uma outra reforma. A reforma da tributação da produção e do consumo ela já foi concluída, agora precisa ser regulamentada, tem um longo caminho para que seja implementada. Agora, tem essa outra briga, que eu acho que o governo não vai comprar agora. Neste ano, acho que está descartada (a tentativa de votar a tributação da renda), mas ainda está na agenda. A mudança significaria tributar as faixas mais elevadas de renda, não da classe média, mas da classe muito alta, via, por exemplo, tributação de dividendos, com as alíquotas mais elevadas para quem tem ganhos realmente muito grandes.
Paulo Gala: (Jean Paul) Prates é uma pessoa muito técnica, conhecedor do setor, e de uma cabeça de transição energética, o que é importante também. É um dos grandes conhecedores desse tema. Eu acho que estava fazendo trabalho muito bom.
A Petrobras é quase equivalente a um ministério, com quase 10% do PIB passando pela companhia, e ela controla preços-chave para toda a economia, como gasolina, diesel e gás de cozinha. Eu brinco que é um dos piores cargos, junto com a chefia do ministério da Fazenda e a presidência do Banco Central.
A Magda Chambriard é bastante técnica também. Ela é mais ligada ao setor, ela conhece muito o setor de óleo e gás, é uma pessoa muito técnica. Agora, resta ver qual linha ela vai dar ao comando que ela vai colocar na Petrobrás. Não acho que falte qualidade técnica, ela foi diretora da ANP.
Na questão de transição energética, é uma diretriz do governo e, por isso, espero que ela continue com essa agenda, que é importante. Além disso, há a exploração do petróleo na Margem Equatorial, que também é importante e pode ajudar economicamente as populações pobres da região.
Por outro lado, (ações relacionadas à distribuição de) dividendos da Petrobras, obviamente, gerou desconfiança (a política recebeu críticas do mercado por supostamente ser contra a distribuição dos proventos nos moldes atuais).
O Prates estava garantindo uma situação de distribuição bastante elevada de dividendos, mas é uma questão que está em aberto agora. Mas não dá para fazer o julgamento de antemão. Assim, é preciso esperar para ver o que ela faz.
Paulo Gala: Talvez haja um acréscimo na conta de investimentos. Atualmente, a discussão na Petrobras é o quanto ela distribui versus o quanto ela investe. Os acionistas, muitas vezes, querem mais distribuição de lucro no curto prazo em detrimento do investimento de longo prazo.
O governo quer mais investimento de longo prazo para desenvolver o país, para desenvolver novas tecnologias. E investir mais passa por distribuir menos. Então, o conflito que está colocado é este.
Vale lembrar que a Petrobras está conseguindo extrair o petróleo do pré-sal ao custo de US$ 6 a US$ 7. Anteriormente, se estimava que custaria algo em torno de US$ 30 a US$ 40. Ela conseguiu fazer, com os investimentos em dez anos, a um custo de extração baixíssimo, por isso ela tem essa lucratividade gigantesca, vendendo a US$ 70 ou US$ 80 (o barril). Com isso, a Petrobras tem uma geração de caixa absurda e capacidade de investimento gigantesca, que pode ser investida ou distribuída (via proventos).
Assim, parece que a preferência do governo é por mais investimentos e menos distribuição de dividendos.
Eu acho que, talvez, o que a gente possa esperar é um programa de investimentos ainda mais robusto. A companhia já estava investindo muito, mas talvez venha um problema maior de investimento na Margem Equatorial, eventualmente energias limpas, transição energética, coisa do offshore eólico e indústria naval.
Paulo Gala: Eu acho que sim. É uma questão de equilíbrio. Como ela tem um sócio que é público e outro que é privado, ela tende a dois senhores, o senhor governo e o senhor mercado.
Na verdade, o senhor governo é a sociedade. Mas ela tem uma rentabilidade tão grande, uma eficiência tão grande, que eu acho que é bastante possível atender essas duas demandas: ter um programa de distribuição de dividendos razoável e um programa de investimentos, que também é importante para a Petrobras.
Basta a gente pegar empresas que também distribuem muito e investem muito, como a Weg, com um programa de investimentos agressivo e que também distribui dividendos. Itaú, entre outras empresas também conseguem combinar (investimento e distribuição de dividendos). Não acho que é contraditório.
Talvez o governo tenha a percepção de que a balança deva pender um pouco mais para os investimentos. Não acho que é uma coisa binária, ou distribui ou investe. Se bem administrada, com uma política de preços correta e investimentos bem desenhados, acho que é perfeitamente possível fazer os dois.
Paulo Gala: Ela está restrita ao setor. Já faz três anos que há uma crise no setor imobiliário chinês. Por enquanto, está sob controle. O fato de ser um sistema financeiro público-estatal ajudou porque houve pouca contaminação dos bancos, como aconteceu, por exemplo, na crise de 2008 nos Estados Unidos, quando os bancos quebraram, principalmente com exposição ao setor imobiliário.
Houve quebradeira das construtoras, mas não dos bancos. Então, por enquanto, é uma crise que está contida.
É difícil fazer uma previsão, se haverá uma bolha imobiliária que vai estourar e vai levar a uma crise generalizada da China. Minha impressão é que não. Eles vão conseguir administrar. Mas também não vejo uma recuperação do setor imobiliário. Tem mais de 100 milhões de casas e apartamentos vazios na China, com o governo acenando com programa de eventualmente começar a comprar essas casas para depois revender para a população.
Eu não vejo uma recuperação do setor imobiliário no horizonte. O que a China tem conseguido fazer é crescer, apesar da crise imobiliária, o que é uma façanha. Ela está crescendo o setor industrial em expansão, veículos elétricos, máquinas, equipamentos e toda essa coisa da indústria chinesa, que conquistou o mundo.
E está crescendo também com a expansão do setor de serviços e varejo. Não é um crescimento como no passado, será algo entre 4% e 5%, se muito. Mas, para uma economia do tamanho da China, já está bem razoável. Então, acho que a tendência é um crescimento menor, contudo, mais equilibrado, e uma longa estagnação do setor imobiliário chinês.
Paulo Gala: Eu acho que melhorou (a percepção do mercado sobre a situação da China). Se a China conseguir crescer entre 4% e 5% ao ano, está ótimo. O mercado está bem tranquilo com essa ideia. O surto aconteceu lá atrás, há dois anos, quando a Evergrande quebrou.
Agora, se desacelerar demais e começar a crescer só 3%, 2%, aí estamos falando de outro cenário, que pode atrapalhar bastante. Eu acho que 4% é mais ou menos o gatilho de tranquilidade. Como a China já é a segunda maior economia do mundo, é o suficiente para deixar o planeta em expansão. Estados Unidos crescendo a 2% e China a 4%… estamos falando de 50% da economia mundial… então, a gente já teria um crescimento basal garantido.
Paulo Gala: (A economia chinesa) pega muito minério de ferro. E tem uma parte relevante disso que vai para construções. A commoditiy está nessa faixa de preço de US$ 100, e nunca mais voltou para US$ 150 ou US$ 200 dos tempos áureos. E acho que não vai voltar mais.
Por outro lado, o minério de ferro tem se favorecido do seu uso no setor industrial chinês, que vai bem, a gente acaba se beneficiando por conta desse crescimento industrial. Mas não é aquele período de exuberância.
Acho que precisa tomar cuidado. Embora aço e minério de ferro não estejam nas máximas como outras commodities, é difícil enxergar um aumento de preço muito significativo.
Além disso, a parte imobiliária americana também não está boa: (o segmento de) lajes corporativas está muito ruim, não há expectativa de expansão. Então, eu tomaria cuidado com essas commodities metálicas.
As energéticas melhoraram, o petróleo subiu, a água também está em alta, mas se você olhar nos últimos 20 anos, a gente está no terceiro pico de commodities. Então, quando está no pico, é preciso tomar cuidado para comprar coisas que são muito dependentes de commodities. E, atualmente, acho que faz mais sentido até ficar vendido.
Fonte: Inteligência Financeira




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