Em um mundo com guerras generalizadas, colocando em antagonismo diferentes blocos militares e ideológicos, os espaços para o diálogo têm se tornado escassos. Apesar dos pedidos sedentos das Nações Unidas pela retomada das discussões no campo do debate e não no campo de batalhas bélicas ou econômicas, parece que os países mais poderosos do mundo escolheram seguir outro caminho. O Fórum Econômico de Davos, realizado todos os anos na Suíça, busca promover a atmosfera ideal para que as nações e seus governantes, principalmente os ministros das finanças, possam apresentar os resultados e prognósticos acerca do cenário econômico de suas respectivas nações. Todavia, com a crescente preocupação de questões regionais, a conferência vem perdendo seu protagonismo, que ressalta a falta de fé de muitas nações no modelo de multilateralismo praticado nas últimas décadas.
Donald Trump, em sua aparição por vídeo na Suíça, deixou uma mensagem bem clara, “produzam na América, ou sejam fortemente taxados”. A retórica protecionista que ganha ainda mais corpo após a posse, mostra que mais uma vez, a tarefa de blocos econômicos negociarem uns com os outros se tornará mais trabalhosa, em um mundo, onde superpotências passam por um momento de robustecimento, no qual mostrar força em todos os campos é essencial. Um mercado acostumado por décadas a funcionar de determinada maneira será mais uma vez obrigado a se adaptar aos desejos e caprichos de um presidente poderoso, mas uma medida relativamente antiquada para nosso tempo, pode também ser arriscada ao longo prazo.
Os BRICS surgiram neste século com o intuito de oferecer oportunidades de diálogo e negócios entre países com desafios socioeconômicos parecidos, contudo, a transformação gradual em um bloco ideológico servindo aos interesses geopolíticos da China, afastou nações ricas do Ocidente e da Ásia de se engajarem com o grupo. Da mesma forma, os entraves protecionistas colocados pela França, ameaçam engavetar um acordo histórico com o Mercosul, após décadas de busca por convergências. A Argentina, que se negou a entrar nos BRICS sob Javier Milei, também levantou a possibilidade de deixar o Mercosul em busca de acordos bilaterais mais promissores com os Estados Unidos.
Todo esse cenário de hostilidades reais, com as guerras, e hostilidades verbais, com as ameaças e bravatas econômicas, leva uma parcela significativa de países a repensar o papel de multilateralismo. Os acordos bilaterais mostraram-se muito eficientes no passado, quando alianças militares e econômicas duradouras moldaram o mundo moderno e nos encaminharam para eras de maior diálogo e menos violência. A demora, todavia, da elaboração de tais acordos, nos dias de hoje, pode dificultar as nações a encontrarem soluções mais rápidas e urgentes para problemas universais. Uma resposta coordenada de blocos políticos e econômicos a condutas belicosas em diversas áreas, pode por fim a crises ainda em seu início, enquanto em um mundo governado pelo bilateralismo, alianças paralelas poderiam criar um imenso conflito de interesses, retardando a solução da crise.
As novas tendências políticas e econômicas estão a ser esculpidas pela era digital, onde tudo prometido e falado não é mais esquecido ou descartado. Em um mundo com tantas questões cruciais em aberto e pouco tempo hábil para resolvê-las, a crise do multilateralismo enfraquece a boa vontade política e a capacidade de resolução dos problemas. Davos de 2025 seja talvez o início do fim de um mundo multilateral, ou apenas o evento que será lembrado como um episódio que mais tarde confirmaria o multilateralismo como a solução mais adequada para os desafios de nosso tempo.
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.
Fonte: Jovem Pan News
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