Se Nelson Rodrigues estivesse hoje vivo, talvez fosse possível que, neste momento, conseguisse refletir da seguinte forma sobre o Vasco x Flamengo: se o Fla-Flu começou 30 minutos antes do nada, a rivalidade entre Flamengo x Vasco não morre nem após o apocalipse. Apesar de, hoje, ela não passar de um gigante adormecido.
No jogo de ida da semifinal do Campeonato Carioca, impossibilitado de jogar em sua casa, o Vasco levou o duelo para o Nilton Santos, campo do Botafogo, tentando “equilibrar” as coisas, já que econômica e tecnicamente, há um abismo inegável entre os clubes. Ainda assim, vitória rubro-negra por 1 a 0.
Autor do gol da vitória, Bruno Henrique chegou ao décimo tento dele contra o Cruz-Maltino. Se havia passado em branco nas cinco vezes que enfrentou o Gigante da Colina com as camisas de Santos e Goiás, BH já tem 10 gols em 15 clássicos pelo Fla, com 10 vitórias, 4 empates e apenas 1 derrota.
O recorte de Bruno Henrique nos ajuda a entender o que se tornou o clássico nos últimos anos. Podemos ir até um pouco além: de 2017 até hoje, o Vasco só conseguiu duas vitórias diante do maior rival. O Rubro-Negro conseguiu, no período, 18 triunfos. Nos últimos dez jogos, são 7 vitórias flamenguistas.
Se nas crônicas de Mário Filho e Nelson Rodrigues a grande rivalidade carioca era o Fla-Flu, os duelos entre Roberto Dinamite e Zico, nos anos 1980, começaram a “apimentar” os encontros entre Vasco e Flamengo. Os dois maiores ídolos dos clubes levantaram a rivalidade, apesar da amizade fora de campo.
Mesmo o time campeão do mundo rubro-negro não teve vida fácil contra a equipe de Bob. Se computarmos todos os 43 clássicos em partidas oficiais da década de 1980, são 17 vitórias flamenguistas, 16 vascaínas e 10 empates.
Falando dos ídolos, em toda a carreira, Dinamite marcou 25 vezes com a camisa cruz-maltina contra o Fla, de 1973 a 1992, em 61 jogos. Já Zico tem 19 tentos em 49 jogos, de 1971 a 1989.
Na era pós Dinamite e Zico, o Flamengo x Vasco viu a rivalidade explodir, principalmente fora dos gramados, com a figura de Eurico Miranda, ex-mandatário vascaíno, quase sempre em destaque. Foi ele que definiu que o clássico era sempre “um campeonato à parte”. Foi Eurico que espalhou ovos de Páscoa para a torcida após o “chocolate” vascaíno diante do rival, nos 5 a 1 de 2000 às vésperas do Domingo de Páscoa.
Duas vezes campeão brasileiro, campeão da Libertadores, vice do Mundial duas vezes, campeão da Mercosul, o Vasco viveu um centenário diferente do rival e chegou ao ápice aos 100 anos no que é o último grande momento do clube até hoje.
O retrospecto na década de 1990 seguiu equilibrado, embora ainda com vantagem rubro-negra: 15 vitórias flamenguistas, 12 vascaínas e 13 empates. A virada do século viu Eurico deixar de ser um personagem folclórico para se tornar nocivo na história do Vasco. Com três rebaixamentos que mancharam sua história, o Cruz-Maltino virou presa fácil para o rival, principalmente a partir da segunda metade da década passada.
Na primeira década do século XXI, a disparidade ainda não era sentida. Foram 16 vitórias do Fla, 14 do Vasco e 9 empates. Mas na década de 2010, já foram 6 vitórias a mais do Rubro-Negro (14 contra 8, além de 19 empates), saldo completamente favorável ao Fla a partir de 2017, quando o Vasco ficou sem bater o rival entre 2016 e 2021. Já vimos também que, desde 2017, foram apenas duas vitórias vascaínas…
Disparidade econômica
Nos últimos anos, a distância entre os rivais aumentou ainda mais com a disparidade econômica das equipes. Depois de restruturação financeira, o Flamengo conseguiu ser protagonista no mercado de transferência e trouxe jogadores decisivos, como o já citado Bruno Henrique, Gabigol, Arrascaeta, Filipe Luís (hoje técnico), Gerson, Pedro e companhia.
No início de 2024, na primeira janela de transferência que os clubes da Série A ultrapassaram R$ 1 bilhão em investimentos, o Vasco tentou rivalizar com o Flamengo. O Rubro-Negro gastou pouco mais de R$ 150 milhões, enquanto o Cruz-Maltino investiu cerca de R$ 30 milhões a menos.
Com a chegada da SAF da 777-Partners, o Cruz-Maltino, por um breve período, esboçou retomar o caminho para montar grandes times uma vez mais, com promessa dos investidores de que o quadro mudaria. Na véspera do clássico em março de 2022, Josh Wander, investidor do grupo, comentou:
“Tem uma promessa que eu posso fazer para os torcedores do Vasco: essa vai ser a última vez na história que o Vasco vai jogar contra o Flamengo com uma desvantagem no orçamento”.
O Vasco associativo, na figura de Pedrinho, entretanto, recuperou o controle da SAF pela iminente bancarrota da 777. O Cruz-Maltino deu dez passos atrás, teve que se reestruturar econômicamente e, até o momento, não vislumbra quando poderá fazer outra promessa como a de Josh para o torcedor. Enquanto isso, o clássico continua com uma rivalidade apenas saudosa…
Fonte: Ogol
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