O futebol muitas vezes é uma bolha: tem uma realidade à parte. Enquanto o mundo todo ficava em casa, jogava-se futebol em diversas partes. Na Ucrânia, partidas ainda são interrompidas por alertas de bomba. Pode tanto ser uma ferramenta de inclusão quanto de alienação. Mas a bolha, vez ou outra, é furada. Na América do Norte, o esporte tenta, a todo custo, ficar alheio às tensões entre Canadá e Estados Unidos. Mas a guerra econômica, uma hora ou outra, vai furar a bolha.
As novas tarifas de importação impostas pelo governo de Donald Trump nos Estados Unidos foram logo respondidas pelos canadenses, até ontem (domingo) governados por Justin Trudeau (o novo líder dos liberais, Mark Carney, deve manter a contraofensiva). A parceria secular dos “irmãos” norte-americanos nunca esteve tão ameaçada.
Canadá e Estados Unidos compartilham a maior parte das grandes ligas de esportes da América do Norte. A NHL é, talvez, a com o maior número de protagonistas canadenses. Gary Bettman, comissário da principal liga de hóquei do mundo, não escondeu a preocupação com o impacto das tarifas nas franquias canadenses.
“O problema nesse sentido é que todos os jogadores, não importa em qual país joguem, recebem em dólares americanos. Portanto, se o impacto das tarifas for a desvalorização do dólar canadense em relação ao dólar americano, isso tornará as coisas mais difíceis e dolorosas”, comentou para o canal CNBC.
Hoje, o dólar estadunidense é negociado no Canadá a 1,44. Imagina como seria para equipes canadenses se, de uma hora para outra, o dólar americano começasse a valer o dobro… Teriam de pagar salários mais altos e se adaptar a um mercado cada vez mais volátil.
Sem contar a incerteza de patrocinadores, já que muitas empresas estão tentando se adaptar a uma nova realidade no mercado, e em como tudo isso pode afetar a distribuição de receitas dentro das ligas.
A lógica da NHL vale também para a NBA e, claro, para a Major League Soccer. O Toronto FC paga o segundo maior salário da liga, de Lorenzo Insigne, que vive litígio com o clube. Insigne ganha… Em dólar americano…
Tensão fora de campo
Para além dos orçamentos dos clubes, a guerra econômica gera uma tensão a mais nos duelos entre Estados Unidos e Canadá, seja dentro das partidas ou nas arquibancadas.
O torneio 4 Nations Faceoff, de hóquei, ficou marcado por uma grande briga entre jogadores canadenses e estadunidenses. É claro, a briga no hóquei é liberada, mas a deste duelo foi além da conta.
As declarações do presidente estadunidense Donald Trump, de que o Canadá poderia se tornar o 51º estado estadunidense, inflamaram o duelo fora do gelo. Trump chegou a sugerir que Wayne Gretzky, jogador dos Canucks que apoiou Trump durante a eleição, poderia ser um bom substituto a Trudeau, a quem chamou reiteradas vezes de “governador do Canadá”.
Além do hino estadunidense, Gretzky também chegou a ser vaiado por muitos compatriotas durante o jogo, que terminou com vitória do Canadá. Trudeau, presente no estádio, fez questão de dar o troco: “Vocês não podem tomar o nosso país, e vocês não podem tomar o nosso jogo”.
Encontro nos gramados
Depois do encontro no gelo, as seleções de Estados Unidos e Canadá podem se encontrar, também, nos gramados. No próximo dia 20, o Canadá faz a semifinal da Liga das Nações da Concacaf com o México e, se passar, pode encarar os EUA, que decidem vaga na decisão com o Panamá.
O técnico Jesse March, que nasceu nos Estados Unidos e hoje comanda a seleção canadense, pediu para Trump abandonar a “retórica ridícula” sobre o Canadá se tornar o 51º estado.
“Como americano, estou envergonhado pela arrogância e desconsideração que demonstramos a um de nossos aliados históricos mais antigos, fortes e leais”, começou por dizer.
“Mas uma coisa é certa: quando olho para o próximo mês, sei que isso irá alimentar nosso time — a mentalidade que temos, a vontade que temos de jogar pelo nosso país, o desejo que temos de buscar este torneio de todas as formas e mostrar dentro e fora do campo exatamente o que é o caráter canadense”, completou.
Trump, em contraponto, disse no Salão Oval da Casa Branca que acredita que toda a tensão é boa para o futebol.
“Eu acho que vai fazer as coisas mais empolgantes. A tensão é uma coisa boa, faz tudo muito mais interessante”, disse o presidente.
Fonte: Ogol
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