Especialistas avaliam que proposta que tramita no Senado Federal deve aliviar o bolso dos brasileiros; proposta enfrenta resistência de governadores por causar diminuição de receita
Após as sucessivas manifestações do presidente Jair Bolsonaro (PL) e de seus apoiadores sobre os efeitos da incidência do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) em itens como os combustíveis na vida do contribuinte, o debate sobre o imposto estadual passou a ocupar uma posição de destaque no noticiário político e nas tratativas de bastidores no Congresso Nacional. Em meio a alta nos preços dos combustíveis – e no segundo semestre do último ano, da energia elétrica – não sobrou acusações de quem seria o grande vilão pelos altos valores pagos pela população por serviços essenciais. Como consequência direta, a alíquota do ICMS entrou na mira de congressistas, que passaram a buscar uma forma de mitigar a constante perda no poder econômico dos brasileiros. De autoria do deputado federal Danilo Forte (PSDB-CE), o Projeto de Lei Complementar 18/2022 pretende transformar o setor de combustíveis, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo como essenciais para a sociedade. Com isso, a tributação do imposto estadual estaria limitada a um teto de 17% – a proposta foi aprovada pela Câmara dos Deputados e está em tramitação no Senado federal. A Jovem Pan procurou especialistas para saber se a medida, de fato, terá o efeito prometido de diminuir os preços e aumentar o poder de compra da população.
A principal alteração nas leis vigentes seria a de não mais considerar os setores de combustíveis, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo como supérfluos. Na visão de Igor Lucena, economista e doutor em Relações Internacionais pela Universidade de Lisboa, o entendimento é coerente, já que o mundo contemporâneo exige que o cidadão utilize de maneira constante os setores de comunicação, transporte coletivo, energia elétrica e combustíveis e são, sim, indispensáveis. “Ele é cobrado de maneira inconstitucional, porque esses bens são essenciais e os Estados não o julgam como tal. Quando você coloca o imposto de ICMS de quase 30%, em alguns Estados são 29%, sobre telecomunicação, quem é que hoje trabalha sem telecomunicação? Do motorista de Uber ao maior banco do país, hoje, todos precisam de internet”, disse à reportagem. Lucena também questiona o momento arrecadatório de alguns Estados, que bateram recorde após a alta nos preços dos combustíveis. “Vimos, recentemente, o Ceará, que é um Estado pobre, dizendo que tinha 11 bilhões de reais no caixa, a maior arrecadação de ICMS da sua historia com os combustíveis. Quando a economia começa a ser paralisada e a inflação passa a corroer a renda disponível das pessoas, o Estado não pode abrir mão disso na sua maior arrecadação? É um contrassenso”, afirma.
Na última quinta-feira, 9, o presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou que aposta que haverá uma diminuição nos preços dos combustíveis se o projeto, em tramitação no Senado, for aprovado, embora sua última medida não tenha surtido efeito. Isso porque um decreto presidencial editado no dia 1º de março, junto a uma medida provisória, reduziram a zero as alíquotas federais do óleo diesel e do gás de cozinha (GLP). A ação do mandatário não teve o resultado esperado e a diminuição no preço dos itens, para o consumidor, não foi amplamente sentida. “Há três meses, eu zerei o imposto federal do diesel; não baixou na ponta da linha. Mas, agora, a gente vai fazer baixar. Vai dar certo dessa vez”, afirmou o chefe do Executivo aos seus apoiadores.
Para o assessor de investimentos e sócio da Ethimos, Kenio Fonseca, porém, é preciso cuidado ao afirmar que a proposta será bem sucedida. “Estabelecer um teto do ICMS sobre combustíveis não garante que o preço da gasolina vai cair proporcionalmente nas bombas dos postos, porque esse alívio tributário pode ser embolsado por empresas que atuam no setor”, alertou. O especialista ressaltou que, na área dos combustíveis, novas pressões externas podem influenciar negativamente na cotação do petróleo – o que causaria um aumento nos preços ao consumidor. No caso da energia elétrica, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) afirmou, em nota enviada à Jovem Pan, que a estimativa do órgão e de que a eventual aprovação e sanção do PLP do ICMS irá gerar uma redução média de 12% na conta de luz, a depender da legislação de alguns Estados.
Argumento muito utilizado por governadores é de que uma eventual diminuição do ICMS produzirá um impacto direto em setores prioritários para a população, como o acesso à educação, saúde ou segurança. Após reunião entre senadores e chefes do Executivo estadual, governadores criticaram a proposta. Um deles foi Rui Costa (PT), que comanda o Estado da Bahia. O petista afirmou que a proposta “não trará benefícios aos cidadãos”, relembrando que o Fórum dos Governadores congelou o ICMS que incide sobre gasolina, etanol e gás de cozinha (GLP). “O ICMS sobre o óleo diesel está congelado desde novembro do ano passado, quando o combustível estava custando R$ 4,90, e hoje já está R$ 7. Essa diferença foi para o bolso de quem?”, questionou. O governador de Mato Grosso, Mauro Mendes (União Brasil), seguiu linha semelhante e disse temer por uma crise fiscal, já que existem obras e serviços já contratados que estão em andamento. “Precisamos de medidas estruturantes pra conter a inflação, e não de medidas de oportunidade que soam como música mas não produzem resultados. Ninguém garante que a redução do ICMS vai reduzir o preço na bomba”, argumentou.
O economista Igor Lucena contraria a argumentação de Costa e Mendes e afirma que, para haver um equilíbrio fiscal com a redução da arrecadação no ICMS, é necessário “cortar gastos desnecessários ou ineficientes”. “Tudo que for supérfluo ou ineficiente para não afetar os gastos do Estados”, resume. Outro argumento rebatido pelo especialista é o de que a medida não garante uma diminuição para o consumidor, já que o ICMS “tem um efeito em cadeia”. “No caso dos combustíveis, da refinaria para a distribuidora, da distribuidora para os postos de combustível e dos postos para o consumidor. O peso dele é altíssimo, ele pode chegar a 40% do preço do produto final na sua composição. A redução da alíquota reduz o preço ou evita que suba proporcionalmente a eventuais escaladas no preço do petróleo. Se tivermos uma diminuição de R$ 0,50 com um aumento da gasolina de R$ 0,20, na prática, teremos uma diminuição de R$ 0,30 centavos. Se houver sucessivos novos aumentos, a retirada do ICMS vai impedir que ele aumente na mesma proporção ou até mesmo impedir o aumento. O resultado será sempre mais dinheiro na mão do consumidor. Ou porque o valor caiu ou porque subiu menos. Se eu ganho cinco reais, consumo os cinco, sendo três em impostos, isso significa que a minha renda disponível é de cinco restantes. Agora, se eu zero o ICMS e, ao invés de consumir cinco reais de um produto, eu consumo a mesma quantidade gastando quatro reais, a minha renda disponível subiu para R$ 6. [Minha renda] Ficou maior”, explicou.
Fonte: Jovem Pan News
Comentários