Sexta-feira, Novembro 22, 2024
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Uso de ‘emendas pix’ cresce e chega a R$ 3,2 bilhões; especialistas criticam falta de transparência

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Destino dos recursos fica a cargo das prefeituras beneficiadas; ‘Distorcem as políticas públicas e facilitam o surgimento de casos de corrupção’, diz presidente da ONG Contas Abertas

As emendas especiais ao Orçamento, nova modalidade de transferência de recursos da União para os municípios, foi aprovada em 2019 pela Emenda Constitucional 105. Desde então, seu uso vem se tornando cada vez maior entre os parlamentares: em 2020, R$ 557 milhões foram aplicados desta forma; em 2021, o valor saltou para R$ 1,8 bilhão e, em 2022, a previsão é de que chegue a R$ 3,28 bilhões, dos quais R$ 39 milhões foram pagos até o momento. Essas emendas também receberam o nome de “emendas Pix”, porque o dinheiro chega ao recebedor assim que é repassado, ou de “emendas cheque em branco”, porque o destino do dinheiro fica a cargo única e exclusivamente da prefeitura que o recebe, sem depender da aprovação de ministérios, nem precisar estar vinculado a contratos ou convênios como em outros tipos. Assim, seria mais fácil utilizar para questões supérfluas ao invés de investir em saúde, educação ou saneamento básico. Outra diferença é que a fiscalização não fica à cargo do Tribunal de Contas da União (TCU), recaindo, em teoria, para os Tribunais de Contas dos Estados (TCE).

Antes, já eram previstos quatro tipos de emendas ao orçamento: as individuais, para cada senador ou deputado; as de bancada, na qual parlamentares de um Estado ou região se unem; de comissão, para os núcleos temáticos do Congresso, e as de relator, popularmente conhecidas como Orçamento Secreto, indicadas pelo parlamentar responsável pelo Orçamento naquele ano. Este último caso foi alvo de polêmicas, em especial, desde o início do governo Bolsonaro, devido à falta de transparência, que as levou a serem bloqueadas pela ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF); posteriormente, o plenário da Corte as liberou, com a condição de que mais instrumentos de controle e transparência fossem aprovados.

Emendas destes quatro tipos de aplicação devem ter programação definida, de acordo com finalidades, alcance social e interesse público indicados na Lei Orçamentária Anual (LOA). Também se busca diminuir diferenças entre diferentes regiões, de acordo com critérios definidos na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Como têm um destino específico, também devem indicar um plano de trabalho para o uso do dinheiro, com viabilidade, requisitos, metas e cronograma de entrega do bem ou serviço público esperado. Os recebedores, sejam Estados ou municípios, devem estar adimplentes com a União. Esses critérios tornam maior a possibilidade de impedimento técnico em caso de problemas e estão praticamente ausentes no caso das emendas Pix, que prevê apenas que sejam vedados o uso para despesas com pessoal e encargos da dívida. Os deputados e senadores têm limites no Orçamento que podem destinar: 50% devem ir obrigatoriamente para a saúde e, do percentual restante, o parlamentar deve indicar um mínimo de 70% para investimento, restando os demais 30% para indicação de gastos com custeio. Na notificação de emenda especial ao município que o parlamentar indicar, estará especificado se o recurso deve ser para investimento ou custeio.

De forma oficial, as emendas Pix foram criadas com o pretexto de que, com este tipo de mecanismo de repasse, os municípios recebem recursos de forma célere, sem as burocracias exigidas nos demais. Contudo, especialistas ouvidos pela Jovem Pan criticam a falta de transparência advinda dessa agilidade: além de não haver uma pré-definição do destino das verbas, há uma ausência de controle de órgãos federais. “Na minha opinião, as transferências especiais são cheques em branco bilionários, pulverizados em gastos de pouca eficiência e qualidade, sem qualquer parâmetro técnico e sócio-econômico. Distorcem as políticas públicas, ampliam as desigualdades regionais e municipais e facilitam o surgimento de casos de corrupção, devido ao controle precário”, analisa Gil Castello Branco, economista e fundador da entidade Contas Abertas, que fiscaliza questões relativas ao Orçamento.

A avaliação é parecida com a de Daniel Couri, presidente do Instituto Fiscal Independente (IFI) do Senado. “Elas são pouco transparentes, pois não é possível identificar no Orçamento federal o destino dos recursos, a não ser o ente recebedor. Essas emendas também premiam o mau gestor, uma vez que não se exige do ente recebedor a comprovação de que cumpre os requisitos de transparência e regularidade fiscal estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal para as transferências voluntárias. O fato de ser um instrumento menos transparente não quer dizer que o recurso será sempre mal aplicado ou que o gasto não seja meritório. Mas os riscos aumentam. Vai depender sempre da responsabilidade do gestor estadual ou municipal e do trabalho dos órgãos de controle”, comenta Couri, que destaca que, em casos de necessidades urgentes, já há outras formas previstas para socorrer municípios com emergências. O presidente do IFI também reforça que não consegue ver nenhum benefício em aumentar a agilidade à custa de menos controle.

Para Paulo Ziulkoski, presidente da Confederação Nacional de Municípios (CNM), o problema não está apenas nas emendas pix, e sim no modelo de emendas parlamentares em geral. Para ele, todas elas criam desequilíbrios regionais. “Nenhum tipo de emenda é considerada necessária e é um modelo federativo de repasse de recursos a municípios que deveria ser diferente, sem interferência política de parlamentares nas decisões sobre a destinação de recursos públicos. Esse dinheiro, para ser distribuído de forma mais igualitária, deveria seguir critérios semelhantes ao do Fundo de Participação dos Municípios, por exemplo. Na forma de emendas, nem todos os municípios são beneficiários. Isso depende de articulação e da vontade política dos parlamentares que escolhem pra quem vão destinar recursos de sua cota do orçamento todos os anos”, explica. O Fundo de Participação dos Municípios (FPM) também é previsto na Constituição e é composto de 22,5% da arrecadação do Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). A distribuição dos recursos é feita pela quantidade de habitantes, de acordo com estimativa anual do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e com o Censo, realizado a cada dez anos pelo mesmo instituto. São fixadas faixas populacionais, cabendo a cada uma delas um coeficiente individual, publicada pelo TCU. Os repasses são feitos nos dias 10, 20 e 30 de cada mês sempre sobre a arrecadação do IR e IPI do decêndio anterior ao repasse.

No entanto, Ziulkoski discorda que as emendas Pix possam favorecer a corrupção ou o gasto com coisas supérfluas, como eventos musicais. Para ele, os Tribunais de Contas são capazes de fiscalizar. “Cada valor destinado a municípios ou governos de Estado é publicizado. Além disso, os tribunais de contas estaduais fiscalizam e auditam as prestações de contas do uso desses recursos. Para dar mais transparência aos processos, é fundamental cada Ente beneficiário fazer as suas prestações de contas, e para evitar casos de mau uso dos recursos, é importante os gestores públicos conhecerem tecnicamente a origem de cada recurso, seguirem legislação e orientações para execução e prestação de contas da forma correta”, explica, ressaltando que a CNM busca ajudar os gestores nessa tarefa com notas técnicas e debates para orientá-los. Contudo, segundo levantamento da CNM, apenas 5,21% dos municípios (366 cidades) que receberam recursos neste formato informaram ao governo federal com o que gastaram.

Fonte: Jovem Pan News

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