Relator da PEC das Bondades, Danilo Forte diz que faltou ‘protagonismo maior’ do Palácio do Planalto para envio e aprovação de reformas estruturantes
O deputado federal Danilo Forte (União Brasil-CE) não poupa palavras para recriminar a criação do chamado Orçamento Secreto, mecanismo utilizado pelo governo Bolsonaro para garantir apoio do Congresso Nacional. “Esse Carnaval, essa quermesse aí de toma lá dá cá, para fazer um orçamento paralelo? As estradas do Nordeste estão uma tragédia porque esvaziaram as rubricas para as estradas e transformaram em benefícios para prefeitos em véspera de eleição, a gente está vendo isso. O Brasil precisa tomar conhecimento disso”, diz. “Isso é problemático para um país que tem tantas histórias envolvendo corrupção na política envolvendo prefeitos, deputados, senadores e governadores. A gente já viu muita gente saindo direto do gabinete para uma delegacia, não tenho dúvida que em pouco tempo isso vai voltar. Já já a polícia vai conseguir verificar várias brechas e a população vai cobrar muito caro do Congresso Nacional pela forma de como se deu a construção desse Orçamento Secreto. Onde tem dinheiro público tem que ter transparência e clareza”, acrescentou.
Embora admita acompanhar a base governista em pautas econômica, o parlamentar não poupa críticas ao Palácio do Planalto e ao Ministério da Economia pela demora no envio de projetos reformistas, o que, segundo ele, contribuiu para a não aprovação de propostas chaves para o Brasil, como reforma tributária, administrativa e do Imposto de Renda. Em seu quarto mandato na Câmara, o parlamentar ganhou destaque recentemente sendo o relator da PEC das Bondades, que driblou a lei eleitoral, decretou o estado de emergência no Brasil para permitir a criação e ampliação de programas sociais, no valor de R$ 41,25 bilhões, às vésperas das eleições 2022. Embora tenha sido o protagonista das negociações que garantiram agilidade na tramitação do texto, em plenário, a proposta foi relatada pelo deputado federal Christino Áureo (PP) por decisão do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP). Forte nega que tenha se sentido traído, embora faça questão de reforçar que “em plenário não existe relator para Emenda Constitucional”. Abaixo, os principais trechos da entrevista:
O Congresso atual se define como reformista, mas nada foi votado sobre reforma tributária, administrativa e do Imposto de Renda. Faltou boa vontade do governo ou dos parlamentares? Em um primeiro momento, a atividade parlamentar e a pauta legislativa são muito conduzidas em função das propostas do governo eleito. Acredito que o governo demorou muito para enviar os seus projetos reformistas. Tivemos êxito em algumas reformas, como da Previdência, que foi um marco, mas deixamos a principal e mais importante para mover a economia, que é a reforma tributária, com um debate ineficiente e aleatório, em cima de propostas já tramitando, mas sem envergadura suficiente. A reforma tributária que conseguimos fazer foi o projeto que reduziu o ICMS dos combustíveis e o Brasil todo está feliz, comemorando. Isso foi uma vitória importante e transformadora. Mas faltou um protagonismo maior do poder Executivo, de ter uma influência maior no Legislativo, e do próprio Congresso Nacional, à medida que ficou esperando, fez uma mudança desastrosa com relação à administração orçamentária, com o Orçamento Secreto, que deixou o próprio Executivo em uma situação desconfortável, sem recursos para investimentos. Isso será um debate muito importante na nova legislatura e espero que comecemos o próximo governo com uma pauta mais célere com relação às reformas para o Brasil ter competitividade.
Mas a que se deve essa demora? Faltou coordenação do Ministério da Economia para essas propostas? Faltou uma proposta firme e que pudesse dar andamento. A guerra dos lobbies dos Estados contra a União é muito forte, só conseguimos fazer essa aprovação do ICMS porque nas redes sociais o apoio foi muito forte. Não sou do governo, voto com o governo na pauta da economia. Nas pautas governamentais não sou tão vinculado, talvez uma proposta mais precisa tivesse ajudado muito.
Com a campanha na rua, o que o Brasil pode esperar do Congresso Nacional ainda em 2022? Quais propostas devem ser votadas? O Brasil ainda precisa concluir algumas votações, estamos com muitos problemas do diesel, a gente pode avançar com os biocombustíveis, biodiesel. E tem também a questão do centro energético, o Brasil precisa dar a energia renovável e impedir o retrocesso, especialmente das térmicas a gás.
O senhor classificou o Orçamento Secreto como uma “mudança desastrosa”. Você considera que essas emendas também prejudicam a imagem do Parlamento, uma vez que para a população o assunto é pouco transparente? Há necessidade de jogar luz sobre a emenda RP9, elas são emendas de ajustes. Você pode ter uma pandemia, uma catástrofe que não estava prevista quando a lei estava sendo discutida no ano anterior, então esse tipo de emenda é necessário para fazer ajustes. Mas esse Carnaval, essa quermesse aí de toma lá dá cá, para fazer um orçamento paralelo? As estradas do Nordeste estão uma tragédia porque esvaziaram as rubricas para as estradas e transformaram em benefícios para prefeitos em véspera de eleição, a gente está vendo isso. O Brasil precisa tomar conhecimento disso. Fora as transferências fundo a fundo, que é um caos, que você pega dinheiro do Tesouro Nacional, joga para prefeitura, governos, ONGs, organização social e não sabe como esse dinheiro vai chegar, se tem prestação de contas. Isso é problemático para um país que tem tantas histórias envolvendo corrupção na política envolvendo prefeitos, deputados, senadores e governadores. A gente já viu muita gente saindo direto do gabinete para uma delegacia, não tenho dúvida que em pouco tempo isso vai voltar. Já já a polícia vai conseguir verificar várias brechas e a população vai cobrar muito caro do Congresso Nacional pela forma de como se deu a construção desse Orçamento Secreto. Onde tem dinheiro público tem que ter transparência e clareza.
Arthur Lira é um dos maiores defensores do Orçamento Secreto… Já tive vários embates com Arthur Lira com relação a isso [emendas de relator]. Acredito que elas precisam existir para ajustes, mas não é esse balcão que está instalado. Sou muito contundente com relação a isso, já fui relator. O Orçamento tem que ter previsibilidade, compromisso com as demandas do país e defender políticas públicas. Tenho uma relação pessoal muito boa com Lira, mas quando se trata de orçamento público sou muito duro.
E como avalia a gestão dele na Câmara? O modelo do Parlamento remoto prejudica muito a discussão no Congresso Nacional e isso distancia as decisões da mesa diretora com relação à participação parlamentar.
O senhor se sentiu traído pelo Lira pela troca de relator da PEC das Bondades quando foi a plenário? À época, líderes diziam, nos bastidores, que o senhor foi preterido porque cogitou retirar o estado de emergência, por exemplo. Não, porque eu gosto do jogo combinado. Fui relator da PEC das Bondades porque o prazo para ser votado tinha que ser 15 de julho, se não tivesse sido votado o Auxílio Brasil estaria em R$ 400, não teria auxílio taxistas e caminhoneiros. Então, como a proposta foi incluída na PEC 15, que era um complemento com relação aos combustíveis, o Arthur Lira me chamou para ser relator na comissão. Em plenário não existe relator para Emenda Constitucional, mas o Arthur me pediu para dar esse título ao Christino Áureo [deputado federal pelo PP do Rio de Janeiro] e eu disse que não tinha problema. Não sou movido a vaidades, sou movido por resultados.
O STF vem sendo criticado por supostamente invadir atribuições de outros Poderes. Na sua visão, o Congresso não tem uma parcela de culpa nessa discussão quando aprova projetos polêmicos, como calote nos precatórios, retroatividade na lei de improbidade? Não tenho a menor dúvida. Nenhum Poder pode invadir atribuições, mas a judicialização da política é um fato concreto hoje, infelizmente. Há um excesso de judicialização e a gente precisa também ter uma convivência mais democrática e compreender as limitações de cada Poder. Ninguém pode entrar nas questões de cada Poder. Mas quando é uma questão que diz respeito à população brasileira e coloca em risco a democracia, há uma interferência mais contundente para harmonizar o entendimento e a sociedade.
O senhor assinou a Carta em Defesa da Democracia, da Universidade de São Paulo. O senhor teme um golpe de Estado no Brasil? Acredito que no Brasil não cabe mais isso. O próprio sistema financeiro e econômico não aceita essa quebra democrática. Eu lutei pelas diretas, pela volta da democracia, então já tenho um histórico com relação a isso. No meio que o mundo está vivendo e o tamanho e importância do Brasil para o mundo, acredito que não cabe mais. Fico muito tranquilo, o Brasil não vai aceitar uma medida que venha a criar uma situação de constrangimento do Brasil perante o mundo.
Mesmo em caso de derrota de Bolsonaro? Caberá ao presidente Jair Bolsonaro respeitar [o resultado das urnas]. Vivemos em um país que não cabe mais esse tipo de questionamento. Não vivemos em uma República de Bananas, vivemos em uma das maiores potências do mundo e o povo brasileira se orgulha disso. Então, não tenho dúvida alguma. [Um golpe de Estado] Não passa na cabeça de ninguém.
Você confia no sistema eleitoral? Confio, fui eleito quatro vezes pelas urnas eletrônicas, como não confiar? Tenho certeza que o Brasil evoluiu. O Brasil tem uma das maiores tecnologias do mundo de eleições, o mundo precisa copiar o modelo brasileiro. O Aécio Neves, quando perdeu a eleição para a Dilma, fez de tudo para desacreditar as urnas, pegou cientistas e técnicos das melhores universidades para encontrar uma falha e não conseguiu.
O presidente Jair Bolsonaro é um dos políticos que coloca em dúvida o resultado das eleições de 2014… Dizer ele pode dizer o que quiser, cada um diz o que quer. Agora: tem que provar. Se não provar, aí é muito fácil. Ele foi eleito por 32 anos pelas urnas eletrônicas, então sempre esteve correto e agora está errado?
O senhor é filiado ao União Brasil, que primeiramente lançou Luciano Bivar como presidenciável e agora tem a senadora Soraya Thronicke, que na maioria das pesquisas não chega nem a 1% das intenções de voto. Se a prioridade do partido é fazer bancada, por que manter uma candidatura dessas? Sou novo no partido, fui convidado para ser uma grande corrente de renovação política e fortalecer as novas lideranças. O que penso da candidatura da Soraya é que ela está em um papel de levar a imagem do partido, ela é uma senadora respeitada, competente. Ela está no meio do mandato, então não tem muito o que perder e está em uma missão de divulgar o partido para que seja conhecido no Brasil inteiro, é o mais importante para ela neste primeiro momento. E eleições sempre têm surpresas, por que ela não pode ser uma surpresa agradável?
Por que a terceira via não decolou? Lula e Bolsonaro são duas raposas velhas da política que se autoalimentam. Lula para poder chegar precisa do Bolsonaro e Bolsonaro para continuar precisa do Lula. Eles fizeram de tudo para que essa terceira via não vingasse, não conseguisse um espaço de alternativa no brasil. Lamento muito, acredito que no primeiro turno quanto mais opção, melhor. É quando delimita o projeto que vai dirigir o país. Eles trabalharam muito bem, inclusive usando as mídias sociais, para impedir um avanço de qualquer alternativa para o Brasil.
Em um eventual segundo turno entre Lula e Bolsonaro, em quem o senhor votaria? O voto é secreto e por fidelidade partidária, em um primeiro momento, tenho que apostar na candidata do meu partido. Não vou cometer a infantilidade de me pronunciar agora e criar um problema partidário. O nosso compromisso é deixar o segundo turno no segundo turno.
Fonte: Jovem Pan News
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